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O desafio da Reciclapac: criar embalagens retornáveis inteligentes para a indústria

Rita de Podestá - 1 nov 2018
O time da Reciclapac (Rogério é o quinto da esq. à dir.): soluções para o transporte de insumos industriais
Rita de Podestá - 1 nov 2018
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Boas ideias têm potencial para gerar negócios inovadores, disso ninguém duvida. O problema é que muita gente não sabe por onde começar na hora de colocar o plano em prática. Dois pré-requisitos, porém, são fundamentais: coragem para agir e sabedoria para firmar as parcerias certas.

A Reciclapac é um exemplo de quando uma boa ideia cai nas mãos certas. Tudo começou em 2012, quando Rogério Junqueira, hoje CEO da startup, saiu do seu cargo de Gerente de Exportações na General Motors (GM) por meio de um programa de demissão voluntária.

O que poderia ser um entrave acabou virando um impulso. O administrador entendeu que aquele era o momento de tirar do papel uma vontade que havia se frutificado ao longo de 28 anos trabalhando na indústria automotiva: diminuir o desperdício das embalagens descartáveis utilizadas no transporte de insumos industriais.

O desperdício é comum em grandes montadoras, nas quais peças automotivas são embaladas em grandes racks de madeira, descartados após o uso. Esse processo gera uma montanha de resíduos e, com isso, alto impacto ambiental – sem falar nos custos desnecessários.

“De repente vi aquele tanto de embalagem que são jogadas fora. Foi quando pensei: quando sair daqui, vou montar uma empresa para resolver esse problema”, diz Rogério. Um ano depois de deixar a empresa, ele cumpriria sua promessa.

Embalagens retornáveis e sustentáveis

Para botar boas ideias de pé é preciso firmar parcerias. A primeira foi com Antônio Perez, profissional experiente na área de Supply Chain. Os dois se tornaram sócios e foram em busca de quem entendia de inovação.

Em 2013, eles contactaram o Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), localizado na Cidade Universitária, em São Paulo. Com apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE/FAPESP), a Reciclapac desenvolvia o seu primeiro produto da startup: o upcycling de embalagens.

“Foi quando descobri que o que queria fazer não era reciclagem, mas upcycling, que é na verdade uma forma de estender o ciclo de vida do produto”, diz Rogério.

A solução desenvolvida permitiu a reutilização de caixas de madeira e papelão em alta escala, por meio de ajustes técnicos e estéticos. O primeiro teste foi feito em parceria com a MWM, uma fabricante de motores à diesel.

“Eles recebiam mercadorias de fornecedores da Europa em São Paulo e jogavam as embalagens fora utilizando novas para o transporte até Jundiaí, onde fica o centro de distribuição da indústria”, diz Rogério. “E o mesmo se repetia no transporte para o cliente.”

Implementado em junho de 2016, o projeto com a MWM reduziu, em apenas um ano, o descarte total de embalagens em cerca de 70%, além de gerar uma economia de até R$ 950 mil.

Nascia então o primeiro negócio da Reciclapac, que levou a empresa a criar e patentear a “Embalagem Retornável COMPACTA”. Sem parafusos ou pregos, o modelo é hoje um dos mais compactos da indústria, com baixo custo de logística reversa e alta capacidade de carga e durabilidade, podendo ser utilizado mais de vinte vezes no processo de transporte.

Da sustentabilidade à tecnologia

Em 2015, por incentivo do Programa Inovativa, os sócios da Reciclapac resolveram tentar a inscrição no Edital SENAI de Inovação para a Indústria. Acabaram selecionados (com outros 31 projetos de empresas de vários portes).

A oportunidade trouxe um novo desafio: criar embalagens retornáveis inteligentes para resolver o problema do transporte de peças especiais. Tratam-se de produtos caros, feitos de aço ou ferro que são enviados vazios aos fornecedores que, por sua vez, devem devolvê-los com as encomendas – peças de todos tipos e tamanhos.

“Na GM, por exemplo, tem mais 400 mil embalagens retornáveis. Chega uma hora em que o fluxo se ‘desbalanceia’, com riscos de parada de linha. Já vi embalagens enormes se perderem, é muito difícil de gerenciar”, diz Rogério. Sua ex-empresa, por sinal, deu apoio para desenvolver o projeto. “Foi um trabalho conjunto da Reciclapac com os Institutos SENAI de Inovação e a GM.”

Encomendas inteligentes

Inovadora dentro e fora do Brasil, a solução da Reciclapac, que utiliza conceitos de Indústria 4.0 – sobretudo a Internet das Coisas (IoT) –, consiste num dispositivo eletrônico para tornar as embalagens inteligentes e conectadas. Acoplado ao produto, o aparelho emite um sinal que é captado por antenas ligadas à rede de Internet das Coisas implementada pela WND Brasil com a tecnologia SigFox.

“O dispositivo envia o sinal para a nuvem, onde temos uma camada de inteligência que identifica a localização”, diz Rogério. “Depois, uma camada acima, está o ambiente virtual das empresas, em que é possível visualizar todo o mapa de fornecedores e acompanhar o processo logístico.”

Por meio da conexão, é possível obter dados como localização, umidade, temperatura, umidade, se houve deslocamento da mercadoria durante o transporte, dentre outros. Informações que otimizam o processo logístico e reduzem a necessidade de investimentos em ativos e custos operacionais.

A primeira prova de conceito foi desenvolvida dentro de dois institutos: o Instituto SENAI de Inovação para Tecnologias da Informação e Comunicação (ISI-TICs), instalado no Porto Digital, parque tecnológico em Recife; e o Instituto SENAI de Tecnologia em Meio Ambiente, em São Bernardo, na Grande São Paulo.

“O SENAI de Pernambuco entrou com a expertise da tecnologia, o SENAI Mário Amato [nome da unidade em São Bernardo-SP que abriga o Instituto SENAI] com a expertise de design e de materiais. Nós entramos com a expertise de embalagens e o conhecimento do processo da indústria”, explica Rogério.

O primeiro cliente a testar o dispositivo foi a Cebrace Vidros – o que permitiu à Reciclapac ampliar sua atuação para além do setor automotivo.

“Estamos implementando a tecnologia em todos os cavaletes de aço que transportam vidros planos para o Brasil inteiro”, diz Rogério, revelando que a startup já teve sua solução aprovada em outras grandes empresas, incluindo a GM.

Além da dupla inicial, a Reciclapac conta hoje com um terceiro sócio, Hélio Silva, que veio liderar a área de tecnologia, e mais cinco funcionários. A expectativa é expandir a equipe, até porque a startup se tornou basicamente duas empresas: uma de sustentabilidade e outra de tecnologia.

Para Rogério, essa trajetória só foi possível pela união de expertises diferentes, que se combinaram em um conjunto ao mesmo tempo coeso e multidisciplinar. “Se você consegue fazer um trabalho em rede, você tem várias especialidades colaborando com o projeto e surgem coisas inesperadas.”

O empreendedor destaca a rede de colaboração e confiança que se formou entre a Reciclapac e os Institutos SENAI de Inovação:

“Nós acabamos nos tornando um time só. As pessoas do SENAI viraram amigos e até hoje torcem para o nosso negócio dar certo”, diz Rogério. Parte da equipe da Reciclapac fica baseada atualmente no UpLab, uma incubadora do SENAI de São Caetano do Sul (SP); além de oferecer experiência em gestão, design, tecnologia, a unidade mantém uma linha aberta com grandes empresas e indústrias.

A história de empreendedorismo da Reciclapac é uma daquelas que provam que, com boas ideias e as parcerias certas, é possível criar transformações significativas. Nem que, antes, seja preciso dar uma guinada completa.

Rogério, o ex-gerente de exportações que virou CEO de sua própria startup, deixa claro que no seu caso a mudança valeu a pena: “Hoje, em vez de ter de bater na porta das grandes empresas, elas é que estão nos chamando.”

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