Vivemos a era das relações líquidas. O conceito, lançado pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman, captura o vínculo cada vez mais tênue e provisório que define as relações contemporâneas. A interação cada vez mais fluida entre consumidores e empresas, sejam elas startups ou grandes corporações, ajuda bem a exemplificar esse conceito.
Nesse novo cenário, uma marca precisa redesenhar seu modo de interagir com seus públicos. “Conectar e acolher pessoas prontas a dar a sua contribuição e enxergar a percepção delas sobre a marca é uma iniciativa fundamental”, diz Juliana Nascimento, coordenadora de Gestão de Redes e Inovação da Natura. O trabalho de Juliana é ampliar a função “ouvir” os consumidores, da empresa, para a função “cocriar”, chamando os consumidores para pensar e fazer junto.
O caminho foi aberto em 2006, com o nascimento do Natura Campus, programa que abriu as portas da Natura para que alunos e professores universitários enviassem projetos acadêmicos a pesquisadores dentro da empresa. De lá para cá já surgiu, por exemplo, o creme antirrugas Chronos Passiflora, cujo ativo calmante foi desenvolvido pela Natura em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina.
Entre as iniciativas do Natura Campus, o Hackathon Natura Campus Media Lab, primeira maratona de inovação da Natura, compõe uma outra forma de tornar as paredes da empresas porosas ao conhecimento e às contribuições que vêm de fora. O Hackathon conteceu em agosto de 2014 na sede da empresa, em Cajamar (SP), e deve se repetir agora em 2015.
Em parceria com o MIT Media Lab (laboratório de inovação do Massachussetts Institute of Technology), foram selecionados oito projetos. E desses, depois de um processo de desenvolvimento realizado ao longo de alguns dias, foram escolhidos dois vencedores, que ganharam bolsas de estudante visitante no MIT, em Boston, nos EUA. Essas ideias devem mais tarde ser aplicadas aos negócios da Natura.
O CoCriando Natura, “irmão” do Natura Campus e subordinado à mesma área na empresa – Gestão de Redes e Inovação, liderada por Luciana Hashiba – tomou forma em 2012, com três desafios (ou questionamentos) lançados a consumidores e consultores em uma página da internet. Um deles visava a criação de um novo kit presenteável, o segundo queria ouvir os consumidores sobre as vertentes a serem abordadas pela linha Ekos e o mais recente, acerca da experiência de bem-estar presente no consumo dos produtos Natura. O CoCriando propõe que gente de fora da Natura participe ativamente no lançamento e na concepção de produtos e serviços, opinando, comentando e sugerindo soluções e alternativas.
Em 2013, a página foi substituída por grupos fechados no Facebook, em que qualquer interessado pode se inscrever. A colaboração é organizada em “jornadas”, como são chamados os temas lançados pelo CoCriando. Cada jornada é fruto de questões que a Natura busca entender no comportamento dos seus consumidores – com a ajuda dos próprios. No grupo sobre Bem-Estar, por exemplo, são postadas perguntas conceituais: “Se um produto tiver a comprovação de bem-estar, isso mudaria a sua experiência de compra?”.
Quando se trata de uma marca, as questões são mais específicas. Em uma jornada da prestigiada linha Ekos, uma das campeãs de venda da Natura, era preciso responder, e comentar, a seguinte pergunta: “Se tivéssemos que escolher uma frente de atuação para engajar o consumidor com a rede Ekos e a Amazônia, qual tema você acharia mais relevante?” As alternativas incluíam diretrizes como biodiversidade, cultura dos povos da região e recursos hídricos.
Os insights dessa jornada, encerrada no início de dezembro, passarão por uma curadoria feita pela equipe de inovação, antes de ser transformados em um relatório. “Analisamos as contribuições e tentamos traduzir o entendimento do consumidor para o nosso olhar”, explica Juliana Nascimento. Uma das jornadas, que buscava envolver o consumidor na criação de um novo kit para presentear, rendeu os primeiros frutos tangíveis do CoCriando. Foram 682 contribuições, em forma de comentários, em um grupo com 1 800 membros. Com detalhamento ainda sigiloso, o produto que resultou desse jornada deve ser lançado ainda no primeiro semestre de 2015.
“A Natura é guardiã dos seus conceitos-chave, como bem-estar e sustentabilidade, mas isso não basta. É preciso saber se o consumidor os enxerga como nós”, afirma Renata Bertolini, coordenadora de gestão de redes e inovação da Natura, e envolvida diretamente com a jornada do Bem-Estar. “Pesquisas de mercado, apesar de necessárias, não suprem totalmente essa demanda”, completa.
O conceito de onlife, em que as esferas real e virtual se complementam, também ajuda a trilhar o caminho da cocriação. A exemplo da jornada de Natura Ekos, encerrada depois de três meses de atividade virtual com uma imersão interativa em um spa em São Paulo. Os 30 membros mais ativos da rede foram convidados a participar de bate-papos presenciais com lideranças, massagens e um exercício prático de psicologia positiva, corrente que propõe a busca da felicidade em detrimento do estudo das doenças mentais.
O CoCriando acaba de gestar uma nova plataforma, que substituirá os grupos de Facebook já no primeiro semestre de 2015. A grade de jornadas previstas para esse ano ainda não está fechada.
Entre os quase 500 participantes dos quatro grupos ativos atualmente (Bem-Estar, Ekos, Maquiagem e Design de Experiências), a equipe de Juliana Nascimento calcula em cerca de 40% o engajamento dos membros nas jornadas. A página oficial do CoCriando Natura no Facebook tem mais de 2,2 mil pessoas e os membros das páginas seguem o perfil das consumidoras e consultoras Natura – mulheres entre 18 e 44 anos.
A relações-públicas Mariana Assis, 35 anos e membro do CoCriando desde o início, é uma delas. “Meu interesse veio da admiração pelos produtos e modelo de gestão da marca. Essa experiência, para mim, confirma a intenção da Natura de ser interativa e inovadora”, diz. Ela ressalta ainda a troca positiva que ocorre entre os participantes com interesses comuns, e não apenas com os representantes da empresa.
Para Juliana Nascimento, o maior objetivo do projeto é trazer o olhar de um consumidor realmente disposto a dar a sua opinião para dentro da Natura. “Todas as contribuições são válidas, não existe certo ou errado nas respostas e comentários”, diz. Do ponto de vista cocriativo, é um processo muito mais humano do que tecnológico. Assim como é, ou ao menos deveria ser, a relação entre as empresas e seus clientes.
O caminho para um capitalismo mais justo e um futuro mais verde passa pela inovação aberta. Referência em compensação de carbono, a Natura aposta em seu programa de aceleração de startups para ajudar a descarbonizar de vez sua operação.
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