Algodão, bambu, café, fibra de cânhamo e de trigo, cortiça, madeira e plástico reciclado. Para o que você imagina que essas matérias-primas poderiam ser utilizadas?
O curitibano Rodrigo Lacerda apostou nesses materiais para produzir acessórios sustentáveis para celulares — de cabos a carregadores, passando por fones e caixas de som.
Na nossa realidade conectada aos smartphones, esses produtos acabam sendo essenciais, mas muitas vezes, quase descartáveis.
“Hoje esses acessórios são meio que commodities. As pessoas não associam o produto a uma marca, tirando essas mais famosas como Apple e Samsung, e acabam comprando o que está mais barato, sem prezar pela qualidade”
Foi com o objetivo de inovar nesse mercado e trazer opções sustentáveis e duráveis que ele fundou a Händz.
A empresa, com sede em Curitiba, tem atualmente 38 produtos no portfólio, mas deve chegar ao fim do mês com 50 e a previsão de faturar 10 milhões de reais até dezembro (em 2023, alcançou os 6 milhões).
Formado em comércio exterior, Rodrigo trabalhou na ExxonMobil, multinacional do setor de óleo e gás, por quase oito anos, somando o tempo de estágio e contrato.
Até chegar o momento em que ele decidiu seguir um novo caminho. Ou aceitava a proposta de outra multinacional, que batia em sua porta, ou empreendia. Ele ficou com a segunda opção.
“No dia seguinte após pedir demissão, comprei uma passagem para a China com a ideia de passar 30 dias entendendo na prática como funcionava tudo o que eu tinha visto na faculdade”
Era 2009 e ele voltou da Ásia com uma mala cheia de catálogos, mas sem exatamente um foco, queria apenas começar a atuar com trading. “Coloquei tudo em uma mesa e comecei a ligar para os meus amigos e conhecidos perguntando se queriam importar alguma coisa.”
Aos poucos, Rodrigo fechou a primeira importação, depois vieram outras e ele se uniu ao irmão para fundar uma empresa. “Eu brinco que a gente começou a importar de alfinete a foguete.”
Depois de seis anos da fundação de sua importadora, Rodrigo sentiu a necessidade de ter um produto próprio.
“Queria algo em que eu pudesse colocar um branding e meu estilo de vida relacionado a esportes e atividades outdoor”
A princípio, pensou em cabos de celular com cores diferentes do que se via no mercado, geralmente brancos e pretos, depois entendeu que as pessoas preferiam mesmo esses tons e que não era essa exatamente essa questão a atacar.
Entre idas e vindas a China (desde o começo dessa história, foram mais de dez), Rodrigo começou a visitar fabricantes locais e percebeu que muitos estavam usando materiais sustentáveis em sua produção, como plástico reciclado, fibra de trigo e bambu.
Então, ele entendeu o que queria fazer: acessórios de smartphone com um design minimalista e uma pegada sustentável. Foram três anos para chegar ao conceito, nome e logo da Händz, que nasceu em março de 2019, com nove produtos, todos produzidos na China, após um investimento de 50 mil reais do próprio fundador.
Mas pouco tempo depois, o negócio enfrentou um um baque com a chegada da pandemia da Covid-19.
“As empresas clientes pararam de comprar porque tudo estava fechado e quem tinha comprado passou a não pagar porque não estava vendendo. Além disso, fiquei sem poder viajar para desenvolver novos produtos”
Em 2021, já com o início da vacinação contra o coronavírus e o aumento da circulação de pessoas, a Händz retomou o ritmo e começou a pensar em lançamentos, entendendo que era muito importante quebrar alguns preconceitos sobre a origem de seus produtos.
COMO ACABAR COM O ESTIGMA EM RELAÇÃO AO PRODUTOS CHINESES E EVITAR O GREENWASHING
Hoje, a Händz trabalha com cerca de 15 fornecedores chineses da região de Dongguan, no sul do país. Entre os desafios da empresa, logo no começo, estava provar que os itens produzidos lá eram duráveis.
“Muitas pessoas associam a fabricação na China a produtos de baixa qualidade, mas a realidade hoje é o contrário disso”, diz Rodrigo. As matérias-primas usadas na Handz também vêm de do país asiático.
“A cortiça, por exemplo, é plantada e colhida em território chinês e passa pela certificação FSC [selo que atesta que a floresta de origem do produto é operada por meio de técnicas adequadas de manejo sustentável].”
O empreendedor conta que a empresa toma cuidado na escolha dos fornecedores para evitar greenwashing – e realiza visitas frequentes para checar a realidade das fábricas.
Segundo Rodrigo, desde a reabertura da China, no pós-pandemia, o governo começou a implementar políticas de certificações, levando em conta pilares ambientais e sociais exigidos pelos seus principais compradores, EUA e Europa.
“Na questão ambiental, as fábricas tiveram que se adaptar no controle de emissão de gases de efeito estufa, economia de água e energia elétrica. E na questão social, foram criadas auditorias para garantir que as pessoas estão recebendo direito e trabalhando em local e condições apropriados”
Outra certificação implantada no ano passado pelo governo, diz o fundador, chama-se GSR (Global Standards Recycler). “Ela garante que essas fábricas estão cumprindo, de fato, com as normas de reciclagem.”
O primeiro produto da empresa foi um cabo feito com corda. Atualmente, em seu portfólio, a Händz conta com carregadores (sem fio e portáteis) e caixas de som feitos com bambu ou grãos de café com ABS reciclado; e cabos de algodão puro, de fibra de cânhamo ou de garrafa pet — todos homologados pela Apple.
A fibra de trigo, por sua vez, é utilizada em fones, nas ponteiras de cabos, como base de carregadores de parede e sem fio. A marca já teve até fones bluetooth feitos com madeira certificada. Eles estão fora de catálogo por terem esgotado mais rápido do que Rodrigo previa, mas ele diz que vêm algumas novidades por aí. E adianta:
“Vamos lançar um cabo feito de cortiça e outro com couro reciclado. E também uma bateria portátil de tampinhas de garrafas retiradas do mar das Filipina. Será o único produto com matéria-prima que não vem da China.”
Rodrigo, no entanto, já está de olho em outras invenções chinesas, com produtos criados com cabos que já foram reutilizados ou com matérias-primas como chá verde e cimento.
Antes de adicionar qualquer item ao catálogo, o fundador diz que faz um test drive.
“Recebo mais de 100 amostras durante o ano e vou usando todas em diversas situações, para pedalar: para correr, para trabalhar. Até lançar, utilizo um produto por pelo menos seis meses.”
A Händz conta com 500 pontos de venda dos seus produtos; o B2B responde por 85% do faturamento da empresa.
“Hoje, as compras no B2C, pelo site, são menores, mas é uma forma de as pessoas terem um primeiro contato com a marca. Mas a tendência é de crescimento, pois antes o B2C representava apenas 5%. Estamos mudando o site e fomentando as redes sociais para que no futuro chegue a 30%.”
A procura dos produtos da Händz para brindes corporativos não foi algo planeado pelo empreendedor, mas ele abraçou a oportunidade há cerca de um ano e passou a personalizar os produtos para atender clientes como Coca-Cola, iFood e Intel.
“A gente percebeu que as empresas estão cansadas de comprar um bloquinho com caneta ou uma xícara para os clientes e colaboradores. Elas querem dar uma coisa com propósito, com percepção de valor”
Entre os planos futuros da Handz, está a aposta em outras áreas. “Não posso abrir os detalhes ainda, mas estamos finalizando uma linha licenciada de produtos eletrônicos da Disney e da Marvel, feitos com materiais reciclados.”
Outro projeto do empreendedor, para o ano que vem, é a instalação de vending machines em diferentes lugares para fazer a marca ganhar capilaridade. “A gente pretende colocar essas máquinas em aeroportos e outros pontos que têm grande circulação”, diz.
Por fim, Rodrigo pensa também em partir para uma linha de produtos no segmento de lifestyle. “A ideia é continuar com o nosso carro-chefe, a parte de eletrônicos, mas abrir para outros produtos como guarda-chuvas e máquinas de café expresso.”
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