Como lidar com uma série de petições para assinar, no auge do isolamento social, sem passar pelo trâmite burocrático de imprimir a papelada, escanear, rubricar – e, depois, enviar os documentos ao destinatário? Não seria mais fácil enviar contratos por um aplicativo de mensagens e, ali mesmo, colher as assinaturas?
Foi para desatar esse nó que os advogados Getúlio Santos, 41, e Renato Haidamous, 27, se uniram e empreenderam a ZapSign.
“Às vezes eu já estava com a documentação pronta para entrar com um processo e, quando dizia que tinha enviado os PDFs [para o cliente imprimir], a pessoa não tinha impressora”, afirma Getúlio. “Aí eu precisava me encontrar com ela – mas os horários não batiam.”
Esse tipo de situação era recorrente, segundo o empreendedor. “As plataformas que eu conhecia até faziam esse processo [de assinatura eletrônica], mas por e-mail”, diz.
A ZapSign se propõe a facilitar essas tarefas, de forma instantânea e sem a necessidade de gerar tokens para identificação. Basicamente, o signatário do documento recebe via app o link do contrato, procuração, matrícula etc., e assina com o dedo (este vídeo explica o passo a passo).
“Nosso mérito foi simplificar ao máximo esse processo, sem perder a validade jurídica da assinatura.”
Getúlio é pernambucano radicado em Belo Horizonte. Antes da ZapSign, ele pilotava seu próprio escritório de advocacia, e também prestava serviços para uma startup de automação de contratos em que o paulistano Renato trabalhava.
Os dois advogados trilharam, portanto, jornadas entre o direito e a tecnologia. Renato foi além e virou desenvolvedor de software. E, num papo sobre o perrengue de assinatura de contratos, os colegas decidiram empreender para automatizar essa etapa.
Eles investiram 10 mil reais no projeto. “Já tínhamos testado a ferramenta em situações reais, mas ainda não era um produto independente”, diz Getúlio. Naquele mês, março de 2020, o anúncio de que a pandemia da Covid-19 chegava ao país mudou tudo.
“Sem querer, lançamos o nosso produto logo quando todas as pessoas e empresas estavam com a mobilidade reduzida – e buscando formas de se adaptar à nova realidade”
Se, antes, assinar um documento online era apenas mais confortável, a partir do isolamento social passou a ser o único jeito possível.
“Resolvemos apostar que havia mercado para nosso produto, mas [ainda] não fazíamos ideia do que a pandemia seria e faria em termos de mudanças de comportamento de todo o mundo”, diz Getúlio.
A assinatura eletrônica foi introduzida no Brasil em normas como o artigo 10, § 2º, da MP nº 2.200-2/2001 e pela Lei nº 14.063/2020.
Para assegurar a autenticação do usuário, a ZapSign captura dados como IP, data e hora da assinatura, além de informações do dispositivo e sistema operacional do signatário.
A integridade do documento, segundo os empreendedores, é garantida por “três camadas”.
“Primeiro, a ZapSign carimba com um certificado digital ICP-Brasil todo documento assinado na plataforma, não permitindo qualquer alteração ao conteúdo; segundo, fazemos um hash único do documento com o [algoritmo open source] SHA256, que fica violado se houver qualquer alteração ao documento.”
Por fim, a startup disponibiliza uma página de verificação do documento, através de um QR code no relatório de assinaturas. “Assim também armazenamos a versão original e assinada do documento, que pode ser baixada.”
O primeiro cliente da ZapSign foi a Lotus Incorporadora. A parceria surgiu quando um amigo de Getúlio o convidou para conhecer um novo loteamento na capital mineira.
“Quando cheguei, ele me contou que o contrato tinha sido assinado por meio assinatura eletrônica. Eu falei: ‘pera aí! Você está usando meu concorrente?’ Ele, então, brincou dizendo que, se eu comprasse o terreno, ele trocaria de plataforma”
Getúlio agarrou a oportunidade e aceitou a proposta. “Ele chegou a perguntar quantos clientes a gente tinha e eu disse que tinha ‘bastante’. Mal sabia ele que tinha sido nosso primeiro cliente pago!”
Como chamariz, o serviço é gratuito para até cinco envios de documentos por mês. A mensalidade mais barata custa 29 reais e dá direito a assinar 20 documentos online.
Há ainda a possibilidade de contratar um plano que integre a ZapSign a qualquer solução de API aberta, por 89 reais mensais.
Hoje, segundo os empreendedores, a startup soma 7 mil clientes pagantes no país, entre pessoas físicas e jurídicas. “Temos desde advogados que atuam sozinhos até empresas cotadas em bolsa.”
Segundo Renato, o fato de ter começado como uma solução digital praticamente “de advogado para advogado” ajudou a impulsionar o negócio, corroborando de alguma forma a validade das assinaturas.
“Quando um cliente vê que seu advogado assinou um papel com a gente, isso nos dá um respaldo, a pessoa não duvida da validade jurídica. E quando um advogado vê outro advogado usando, pensa ‘eu preciso me modernizar’ – e acaba testando, também”
Decididos a não gastar muito com propaganda, os sócios incrementam o boca a boca sempre que podem:
“Lembro que um amigo estava rodando uma campanha em uma rádio que incluía iniciativas que diminuíssem o contato e os riscos de contrair o coronavírus”, diz Renato. “Liguei para ele e expliquei que a nossa ferramenta eletrônica proporcionava isso.”
O acesso à plataforma cresceu rapidamente, segundo os sócios. Em pouco tempo, o número de usuários saltou de poucas centenas para 220 mil.
Eles estimam que todos os dias a startup conquiste em média 50 novos clientes pagantes. O número de pessoas que já assinaram um documento pela plataforma hoje ultrapassa 4 milhões.
A ZapSign fechou 2021 faturando 6 milhões de reais. A expectativa é, no mínimo, triplicar esse montante em 2022.
O crescimento acelerado, claro, traz desafios para o negócio. Getúlio afirma:
“Estamos num ritmo frenético. A cada três meses, a empresa parece que dobra de tamanho e precisamos nos adaptar. É como se tudo aquilo que você alinhou com a equipe mudasse de repente”
A internacionalização já começou. Segundo a contagem mais recente, a startup atende 53 clientes internacionais em oito países: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Estados Unidos, México, Peru e Uruguai.
Quem vê a dupla de advogados-empreendedores conquistar clientes lá fora em tão pouco tempo talvez não imagine os “erros bobos”, como os próprios definem, que antecederam os resultados.
Um exemplo: o primeiro domínio de e-mail deles foi bloqueado porque os sócios tinham comprado um mailing e enviado spam para os endereços eletrônicos cadastrados, achando que aquela seria a chave do sucesso para conseguir acessos ao site.
Outro equívoco foi começar o negócio contratando prestadores de serviço (que não necessariamente entendiam do assunto) em vez de já estruturar de cara uma equipe, mesmo que pequena.
Culpa de uma “cultura do teste” que, segundo Renato, era adotada enquanto a ZapSign ainda era vista como um hobby de dois caras do direito.
Atualmente, o time da ZapSign tem 21 pessoas. Em meio ao crescimento acelerado, os sócios pensam em como recompensar a equipe com planos de carreira e fortalecer a cultura corporativa num esquema de trabalho remoto.
A startup nunca teve – e nem pretende ter – sede fixa, até como forma de reforçar seu caráter essencialmente online e avesso à burocracia. Renato afirma:
“O digital se tornou um dos principais pontos de experiência entre empresas e consumidores. Mesmo profissões e negócios tradicionalmente offline, como restaurantes, já se adaptam ao mercado online – desde o marketing via redes sociais até a venda por meio de sites e aplicativos”
Getúlio concorda: “Pode parecer uma afirmação clichê, mas a tecnologia e a pandemia romperam por completo a necessidade de presença física para o desenvolvimento de um negócio.”
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