por Larissa Magrisso e Renata Steffen
Estamos todos torcendo para essa crise acabar. Para tudo voltar ao “normal”. Ninguém aguenta mais. Porém, especialistas afirmam que teremos que fazer quarentenas periódicas até que seja encontrada uma vacina. Será que até lá estaremos acostumados com o home office, a escola em casa e em ir ao mercado de máscara?
Já começamos a nos habituar em assistir a shows através de lives, passear com o cachorro de luvas e não abraçar as pessoas. Percebemos também que o jeito como vamos encontrar amigos e família, trabalhar, cuidar da casa, fazer compras, estudar e nos exercitar vai mudar mesmo após a crise. Afinal, a vida dificilmente vai voltar a ser como antes.
Para quem trabalha com comunicação, como nós, muita coisa já mudou. Na verdade, já vem mudando ao longo das últimas décadas. O aquecimento global, a diversidade, o feminismo, o racismo, a responsabilidade social e o consumo consciente estão cada vez mais presentes na estratégia das marcas.
No final dos anos 1990, quando éramos jovens estudantes de comunicação, esses tipos de pautas eram geralmente abordadas pelo jornalismo. E ainda assim muito raramente. Elas também estavam em campanhas pontuais do terceiro setor — normalmente de clientes pro bono das agências, pois geravam anúncios com grande possibilidades de ganhar prêmios.
Esse cenário se alterou nos últimos 20 anos, especialmente por causa das redes sociais, que deram voz ao público consumidor e, sobretudo por causa das novas gerações, que demonstram uma preocupação social e política cada vez maior.
Com a pandemia, é provável que assistiremos a um aprofundamento desse panorama de preocupação com questões pertinentes que vão além da venda de um produto .
Com isso em mente, a W3haus, com sua visão estratégica, e a Laboota, com sua expertise em conteúdo visual, criaram uma iniciativa chamada “Conversas que importam”, que está mapeando os grandes assuntos e tendências dessa nova realidade. O primeiro report trata de violência contra a mulher, que infelizmente vem crescendo no período de quarentena devido ao convívio mais intenso.
Em Portugal, por exemplo, as queixas aumentaram 50% em março. No Brasil, as denúncias de agressões cresceram 17% no período da distanciamento social (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos). De acordo com dados do Plantão Judiciário, só no Rio de Janeiro o aumento de casos foi de 50%.
A onda de humanização de proporções mundiais trazida pelo vírus nos faz enxergar essas e outras vítimas. Há pessoas por trás dos dados estatísticos e elas podem inclusive modificar a trajetória da curva
Há gente por trás do atendimento que os doentes têm nos hospitais. Humanos que precisam continuar trabalhando para que os alimentos e produtos de higiene sejam produzidos na fábricas e transportados até os supermercados e de lá cheguem nas gôndolas.
Alguém faz a comida que comemos e um trabalhador nos entrega em nossa casa. Os cantores, palestrantes e jornalistas também usam pijamas, têm filhos e cachorros, mas continuam se esforçando para fazer lives e transmissões direto de suas casa.
Nunca tivemos tanto contato com as famílias, nunca fizemos tantas ligações para amigos, mesmo que muitos deles já estivessem distantes. Estamos todos trancados, sem ver ninguém, mas paradoxalmente voltados para o que é mais importante: as pessoas.
E é para esse contexto que as marcas têm que olhar. Existem pessoas por trás da empresa, e existem pessoas do outro lado do balcão (ou da tela)
Não é mais admissível que uma empresa acredite que mais de 9 mil mortes sejam um sacrifício inevitável para que a economia não deixe de funcionar. Nem que uma influenciadora defenda o isolamento, mas promova festas em casa durante a quarentena.
Como disse o especialista e consultor em diversidade Ricardo Sales ao Estadão:“É preciso destacar o desejo das marcas criarem conexões mais autênticas e emocionais com seus públicos. Entretanto, é preciso atenção: discurso e prática devem estar sempre alinhados. Não adianta ‘lacrar’ na publicidade e não se esforçar para criar uma cultura e ambientes de trabalho mais inclusivos”.
No final das contas, o recado é: tem que se importar de verdade. Uma pesquisa da consultoria Croma revelou que as 10 marcas mais lembradas pelos brasileiros ao longo dos primeiros dias de pandemia não são as que vendem os itens de necessidade básica ou de saúde. Lá estão marcas que se posicionaram diante do problema, tomaram atitudes e humanizaram as relações comerciais.
Por isso, acreditamos que comunicadores e marcas devem abraçar sua parcela de responsabilidade em relação à crise, ajudando a resolver os problemas enquanto cuidam também do negócio.
Precisamos propor uma comunicação que faça sentido com a missão, o posicionamento, os territórios de marca. Que atenda a necessidade do público, mas também possa contribuir para a melhora da sociedade como um todo. Inclusão e transparência são pautas contínuas que se mostram ainda mais relevantes em momentos como esse.
Não sabemos qual será o novo normal, nem todos os impactos que a pandemia terá sobre a comunicação. Mas sabemos que só vão se manter relevantes as marcas, veículos e creators que se importarem de verdade com o que importa para as pessoas.
Larissa Magrisso, VP de criação e conteúdo da W3haus.
Renata Steffen, diretora criativa e sócia da Laboota.
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