Erguido nos anos 1940, o galpão com 15 metros de pé direito e 20 mil m² de área útil abrigou a Metalúrgica Atlas, considerada a “fábrica das fábricas” por produzir fornos e equipamentos industriais fundamentais para dar o “start” na siderurgia brasileira.
Submetido a retrofit, o espaço na Vila Leopoldina, Zona Oeste paulistana, recende a novo – e acaba se de transformar no State. Em soft opening desde 2019, o empreendimento inaugurou oficialmente na última sexta, 14.
“Estamos ressignificando este lugar, que hospedou atividade industrial e hoje tem um novo sentido”, diz Jorge Pacheco, CEO do State e sócio-fundador da Plug e da Sangha Investments:
“O retrofit é comum na Europa e nos Estados Unidos, onde esses espaços são mantidos. Aqui é mais comum, e normalmente mais barato, destruir e construir tudo de novo”
O State se anuncia como o “maior hub independente de inovação e economia criativa do Brasil”. Com capacidade para 3 mil pessoas e mobiliário padronizado produzido a partir de design open source, a estrutura impressiona.
Há salas de diversos tamanhos, módulos com arranjos variados para squads, departamentos ou startups inteiras, auditório e uma arquibancada que deve funcionar como ágora startupeira, para palestras, pitches e pocket-shows.
A INICIATIVA ACABOU SALVANDO O GALPÃO DE SER DEMOLIDO
O State foi idealizado por Jorge e concebido junto com a FLAGCX. A inspiração, ambiciosa e assumida, vem de hubs como o parisiense Station F, o nova-iorquino New Lab e o madrileno La Nave.
“A Melicidade, o espaço do Mercado Livre [em São Paulo], também é uma grande referência, mas foi construída do zero”, diz Jorge. O State, ao contrário, foi salvo da demolição.
“Um amigo me falou do galpão, vim olhar e logo já estava conversando com a Votorantim. Eles iriam demolir, mas quiseram ouvir minha proposta. Me perguntaram se eu tinha dinheiro; disse que não, mas que captava. Rapidamente montei um business plan e apresentei”
A ideia original do Grupo Votorantim, dono do terreno e do galpão, era transformar o espaço num conjunto de edifícios residenciais, como já acontece em outras áreas do bairro, um ex-distrito industrial. Mas Jorge conseguiu convencer o board da divisão de Serviços Imobiliários a manter o galpão de pé e a recauchutá-lo.
A PROPOSTA É DIVIDIR O PROTAGONISMO COM AS EMPRESAS RESIDENTES
À frente da Plug, Jorge ajudou a colocar o Cubo de pé, na Vila Olímpia, e foi responsável de eventos no espaço por três anos. “Depois que trabalhei no Cubo, muitas empresas me procuraram querendo montar ‘um Cubo’ para elas”, diz.
O State, de certa forma, é uma resposta a essa demanda — mas com Jorge no comando. Benchmarking entre os hubs de inovação do país, o Cubo tem seu nome indissociável do Itaú, investidor junto com o fundo Redpoint eventures. Com o State, Jorge procurou diluir o protagonismo e compartilhá-lo entre as residentes.
“O Cubo tem um trabalho incrível, mas só se sabe que a Dasa e a brMalls estão lá quando se vai ao andar dessas empresas. O peso do Itaú tira o protagonismo de quem está ali”
Em nome dessa “neutralidade”, nem sequer a Votorantim assina o espaço. Jorge não revela o investimento feito no State, mas diz ter uma relação convencional de locador/locatário com a empresa dona do galpão.
O STATE ABRIGA TIMES DE INOVAÇÃO DE QUATRO EMPRESONAS FRANCESAS
Entre as residentes, estão a agência digital Soko e também a Mesa, butique de inovação e desenvolvimento de projetos (para clientões como Nestlé, Google e Gerdau). Em média, a mensalidade custa 1 200 reais por posição.
“O ideal é que as empresas fiquem pelo menos um ano, o relacionamento leva tempo para ser construído. Mas não é uma exigência contratual. Hospedei por dois meses a PicPay enquanto a sede deles não ficava pronta”
A lista de ocupantes reúne ainda as áreas de inovação de um quarteto de grandes companhias francesas, que juntas formam o que é chamado ali de La Fabrique: BNP Paribas, Carrefour, Edenred e Ingenico.
A La Fabrique é um protótipo do que Jorge imagina que o futuro do State, em escala mais ampla: times de empresas de setores diferentes “somando forças”, acelerando startups e encontrando convergências para criar novos produtos.
UMA CURADORIA SELECIONA OS RESIDENTES DO HUB DE INOVAÇÃO
Diferentemente de um coworking tradicional, o State estabelece uma curadoria; a ideia é priorizar clientes de setores como biotecnologia, hard science, inteligência artificial e todos aqueles de alguma forma envolvidos com a “revolução 4.0”.
“Com a curadoria, busco criar uma comunidade, um lugar onde as pessoas digam: ‘É ao lado dessa galera que eu quero trabalhar”
Caso não consiga atrair os inquilinos desejados, o empreendedor admite flexibilizar suas premissas e rever a curadoria no futuro. Por enquanto, porém, acha importante “correr o risco” e manter essa barreira de entrada.
“Reservei um fôlego econômico para ter no State a turma que quero ver junta. Mas isso pode mudar, volta e meia a gente é obrigado a pivotar nossos negócios.”
JORGE ESPERA QUE O STATE POSSA ATRAIR RESTAURANTES E GALERIAS
Ex-distrito industrial, a Vila Leopoldina vem se metamorfoseando há anos num bairro residencial, verticalizado, mas com um pé na economia criativa. Ali funcionam as produtoras O2, de Fernando Meirelles, e Paranoid, de Heitor Dhalia, e também a ARCA, espaço de eventos inaugurado em 2018 com a edição daquele ano da SPFW.
Ao mesmo tempo, nas cercanias do State persiste um cenário de degradação, com um conjunto habitacional deteriorado e uma “filial” menor da cracolândia.
À espera de aprovação, o Programa de Intervenção Urbana (PIU) Vila Leopoldina prevê medidas de reurbanização que impactariam, segundo dados oficiais, 1 200 famílias de baixa renda na região.
Jorge diz que a criminalidade ali era pior há cinco anos, e vislumbra o hub como um motor que movimente a economia do entorno. E assim como o Hub Criativo Beato, em Lisboa, e o New Lab, em Nova York, crê que o State possa transcender a função de espaço de negócios para algo ligado a lifestyle, atraindo restaurantes e galerias de arte.
A TRANSFERÊNCIA DA VIZINHA CEAGESP SEGUE UMA INCÓGNITA
Mais difícil é acreditar que a Ceagesp deixe enfim a Vila Leopoldina. A central de abastecimento é considerada um entrave ao desenvolvimento — e ao crescimento imobiliário — do bairro. A negociação para sua saída, que envolve as três esferas de governo, já soma uns 20 anos. Mesmo assim, Jorge se diz otimista:
“Oitenta por cento dos operadores do Ceagesp são favoráveis à mudança, porque a estrutura é muito custosa… Eles perdem dinheiro, chegam a ficar seis horas numa fila de caminhão”
Em janeiro, no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, o governador João Doria voltou a mencionar a ideia de implantar um Centro Afiliado da 4ª Revolução Industrial (C4IR) — projeto chamado de “Vale do Silício” de São Paulo.
A ideia seria fomentar a produção de tecnologia e geração de empregos ligados à Indústria 4.0 num terreno do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), próximo ao State.
O GALPÃO SEGUE EM OBRAS — MAS DE DIA A JORNADA É SILENCIOSA
Por enquanto, o State segue em obras. Como o maquinário opera de noite e na madrugada, o “dayshift”, a jornada diária de trabalho, é silenciosa.
Só perto do fim do ano os tapumes que escondem mais da metade do galpão vão cair e revelar o espaço que Jorge quer ver ocupado por laboratórios de hard science e por empresas que necessitam de espaços e estruturas fabris.
No futuro, ele imagina replicar o conceito do hub em outras praças:
“Vejo muito o State com uma experiência internacional. Quero cravar pé em outras culturas, com outro tipo de acesso, de talento, de negócio… Em hard science, por exemplo, a gente ainda está engatinhando, não tem aqui no Brasil empresas que colocam dinheiro a risco”
No momento, porém, a atenção está toda voltada para as novidades que devem sair do galpão da Vila Leopoldina. “Em 2020 o foco total é transformar o State no lugar mais incrível de São Paulo para a inovação. Esse é o meu compromisso.”
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