“Hélou, mái neim is Anitta”, informa o card de fundo amarelo com a foto da cantora. A grafia da frase está toda bagunçada, claro, mas a “culpa” não é da Anitta, e sim da Storm Education.
A edtech nasceu com a proposta de dar uma sacudida na mesmice quando o assunto é ensino de inglês, fazendo uso de bom humor e do WhatsApp para impactar mais gente. “Eu sou publicitário e acredito que a criatividade tem que ser usada para solucionar um problema — e é isso que a Storm faz”, diz Marcos Almirante, fundador da startup.
Os alunos têm contato com o idioma a partir de memes — estáticos, para não consumir os dados de ninguém — e áudios de zap, com os conteúdos adaptados à cultura brasileira (nada daquela chatice de “Hi, my name is James”). Essa adaptação inclui traduções fonéticas para facilitar o entendimento da pronúncia, vide a frase que abre este texto.
Aula 1 da Storm sobre apresentação, com a cantora Anitta usada como referência e o detalhe, entre parênteses, da tradução fonética criada pela empresa.
O curso se compõe de 150 microaulas de nível básico, com foco em repetição, desafios e envio de áudios para avaliação de pronúncia, e pode ser acompanhado no ritmo do aluno:
“A pessoa pode fazer as aulas pelo WhatsApp no caminho para o trabalho, num momento de pausa em casa. A gente está cansado de ouvir áudio enviado pelo aluno com barulho de novela no fundo, de trem, cachorro latindo… Ou seja, dá pra aprender no dia a dia”
Os áudios são gravados pelos professores que trabalham com a edtech, sempre com irreverência (numa aula com música dos Beatles, a banda é apresentada como o “Exaltasamba do Reino Unido”). Atualmente, os alunos não pagam nada para ter acesso às microaulas: a Storm atua no B2B, vendendo o curso a empresas e organizações, que por sua vez podem distribuir o conteúdo como uma bolsa ou repassar como benefício gratuito a seus funcionários.
Marcos é conselheiro da ONG Abraço Campeão, que leva artes marciais, educação e desenvolvimento pessoal para crianças e jovens do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro.
Ensinar inglês poderia ser uma forma de aumentar o impacto do trabalho que já era feito, pensou o publicitário. Mas aí veio a pandemia de Covid-19 e o público parou de frequentar a sede do projeto. Marcos notou, no entanto, que os jovens continuavam super ativos online.
“O WhatsApp é uma verdadeira praça pública, onde todo mundo fala, faz fofoca, lê notícias… Então, pensei: vamos tentar ensinar inglês aqui para ver o que que acontece.” Assim, a ONG adaptou o conteúdo de um curso de inglês para a “língua do WhatsApp”.
“E o que é essa língua do WhatsApp, afinal? São os memes que você manda para todo mundo, as figurinhas e mensagens de voz…”
A chance da ideia dar certo parecia grande. Afinal, o Brasil é o país que mais manda mensagens de voz no mundo. Pelo menos foi o que disse Mark Zuckerberg, CEO da Meta (dona do WhatsApp), num evento em junho de 2024, em São Paulo: os brasileiros enviam quatro vezes mais áudios do que os usuários de qualquer outro país.
Os memes são recursos utilizados pela Storm para transformar o aprendizado em algo divertido.
E, de fato, a iniciativa da ONG deu certo. “Começamos com uma turma de 20 alunos do Abraço Campeão e, de repente, viralizamos, saindo do Complexo do Alemão”, diz Marcos. “Os estudantes mandaram para amigos e a gente começou a ter alunos no Rio de Janeiro inteiro, depois fora do Estado, chegando a 2 mil alunos e 100 ONGs parceiras… Tudo feito com o trabalho de mais de 50 voluntários.”
Foram dois anos atuando dessa forma, voluntária, até que Marcos percebeu que o impacto da ideia poderia ser ainda maior. Começou então a estudar o mercado para transformar o projeto numa empresa.
“A gente resolveu se estruturar para poder escalar de verdade. Porque levar inglês para 500 alunos é importante, mas o impacto é maior se levarmos para 500 mil ou 5 milhões…”
O publicitário cercou-se de pessoas com expertise em negócios, dentre elas Susan Pastega. Ela era uma das professoras voluntárias no projeto da ONG e na época estava deixando o EBANX em Singapura, onde atuava como diretora executiva, e iniciando uma pausa na carreira. Susan foi uma das pessoas que insistiu com Marcos que para escalar o projeto deveria virar empresa.
“Eu não entendia nada de negócios e tecnologia e falei para ela: Toma aqui a chave da empresa porque eu não sei como começar. Vou aprender’. Fui então estudar em Oxford, conversar com outras pessoas e ela assumiu essa tarefa, trouxe um CTO e começamos a desenvolver a tecnologia e o MVP sob a liderança dela. A Susan foi a primeira pessoa a acreditar na Storm a ponto de investir na gente em 2022.”
Depois, Susan voltou para o mercado (como gerente sênior de tecnologia do Grupo Boticário) e Marcos, já com mais experiência, assumiu a liderança. Nesse período, de 2022 a 2024, a Storm funcionou em MVP e conseguiu captar, no fim do ano passado, 500 mil reais com a Anjos do Brasil. Até que no começo deste ano, foi lançada oficialmente no mercado.
Segundo dados da Storm, 99% dos brasileiros com smartphone faz uso do WhatsApp, enquanto apenas 5% da população do país sabe falar inglês. Daí a sacada de se utilizar o aplicativo para impactar o enorme contingente de pessoas que não dominam o idioma.
A licença anual custa 300 reais por usuário. Para ilustrar a necessidade das empresas de capacitar seus funcionários para falar inglês, Marcos cita a indústria do turismo, em que essa demanda é ainda mais sensível:
“Um hotel em Copacabana com 30 funcionários pode não ter grana para pagar o curso de inglês para todo mundo, então quem acaba tendo a oportunidade é a gerência e o pessoal da recepção. Mas se uma camareira fala um pouquinho do idioma, a experiência do turista já é melhor…”
A questão, segundo o empreendedor, é que para o hotel “não vale a pena investir 2 mil reais num curso para essa funcionária, porque o salário é muito baixo e o turnover, muito alto”. Porém, com uma licença para um curso básico a 300 reais por ano, a coisa já muda de figura: o hotel começa a ver vantagem no investimento necessário para capacitar sua funcionária e oferecer um atendimento melhor aos hóspedes.
O primeiro contrato da Storm foi fechado com o Consulado Britânico do Rio de Janeiro e com a GOYN (Global Opportunity Youth Network), iniciativa que no Brasil se chama Juventudes Potentes e busca impulsionar a vida de jovens por meio da inclusão produtiva. Essas duas instituições patrocinam bolsas de estudos destinadas a um público atendido por ONGs.
A startup também tem parcerias com a Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e do Sindicato de Hotéis do Rio de Janeiro, que divulgam o curso de inglês para marcas e estabelecimentos associados; e a 1MiO (Um Milhão de Oportunidades), iniciativa da Unicef para gerar oportunidades para jovens — e que disponibiliza a capacitação da Storm a partir da oferta de bolsas.
Outro modelo de negócio da Storm é batizado de “branded education”. Marcos diz que bolou esse conceito a fim de atrair empresas para expor suas respectivas marcas dentro dos conteúdos das aulas.
Ele dá um exemplo hipotético:
“Uma operadora de telefonia móvel pode oferecer o curso gratuito para os clientes que compram seus pacotes de dados e, em algum tipo de conteúdo de vocabulário, podemos inserir imagens dos produtos da empresa, como por exemplo um celular”
Marcos conta que a Storm está costurando parcerias com agências para oferecer esse serviço a seus clientes, e também vem batendo na porta do departamento de marketing das empresas:
“Na prática, em vez de essa marca interromper conteúdos que você está consumindo no YouTube ou no Instagram, ela está trazendo brand content, só que te ajudando a melhorar como pessoa e numa plataforma que as marcas não chegam, o WhatsApp.”
Em breve, diz Marcos, a Storm vai lançar uma inteligência artificial que pode gerar conteúdos em voz e avaliar os áudios dos alunos. IA à parte, o empreendedor afirma que o tom continuará “humanizado”.
“Essa persona da Storm vai sempre incentivar os alunos porque afinal, a gente está falando com a base da sociedade, que sempre ouviu: ‘você não precisava estudar inglês, isso não é para você, você nunca vai morar fora…’, e por isso precisa de estímulos para seguir com o curso sem desanimar.”
De olho na COP 30, que deverá atrair cerca de 50 mil estrangeiros à capital do Pará, Marcos diz que vem “fazendo uma triangulação” com a prefeitura e algumas empresas, que patrocinariam bolsas a serem distribuídas para os interessados, ajudando assim a capacitar a mão de obra local no domínio do inglês:
“Estamos trabalhando com a prefeitura para levar, até novembro, inglês para motoristas de aplicativos, profissionais de aeroporto, restaurantes e hotéis… Nossa expectativa é atender entre 5 mil a 10 mil pessoas, garantindo que a experiência de todo mundo no evento seja melhor — e que a COP deixe um legado para a cidade”
Olhando mais adiante, e pensando em formas de impactar mais gente, a longo prazo o empreendedor quer ampliar o foco para abranger o ensino de outros conteúdos:
“A gente diz que a Storm leva educação de impacto, o que significa entregar na mão das pessoas conteúdos que vão gerar um impacto automático nas suas vidas. Então, se te ensino inglês agora, isso pode melhorar a tua carreira muito rapidamente. E a gente acredita que essa mesma lógica vale para educação financeira e tecnologia — duas frentes em que a gente pretende atuar.”
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