Natural de Guarulhos (SP), Eduardo Lyra, 34, tem uma jornada de superação. Seu pai chegou a ficar preso por anos, até ser solto e se livrar do vício em drogas, quando a família se mudou para o interior — nessa época, o menino Edu tinha 8 anos.
Aos 22, ele escreveu um livro, Jovens Falcões, com histórias de 14 brasileiros empreendedores. Trancou a faculdade de jornalismo na Universidade de Mogi das Cruzes para se dedicar à venda da obra. Treinou uma equipe de garotos que saía batendo de porta em porta oferecendo cada exemplar por R$ 9,99.
Foi assim que Edu arrecadou 50 mil reais e realizou o sonho de fundar uma organização social para transformar a vida da comunidade periférica em que vivia. A Gerando Falcões nasceu em 2011, em Poá (SP). Hoje é um ecossistema em que 138 ONGs recebem, além de apoio financeiro, suporte para que seus líderes desenvolvam habilidades e alavanquem sua capacidade de impacto em 1 550 favelas de 23 estados do Brasil.
Atualmente, a Gerando Falcões toca várias iniciativas, de campanhas permanentes como as doações por assinatura a outras pontuais, como Corona no Paredão, Fome Não e #TamoJunto – Ninguém fica pra trás, que arrecada fundos para população atingida pelas chuvas de verão na Bahia e Minas Gerais.
Além disso, há o conjunto de programas de inovação social da Favela-X, cujo objetivo é criar uma espécie de biblioteca de soluções possíveis para que a rede de ONGs troque informações sobre modelos de prosperidade social e intervenção urbana.
Auditada pela KPMG, a Gerando Falcões adota, desde 2016, o sistema de gestão da Ambev. Por sinal, Edu e o empresário Jorge Paulo Lemann se aproximaram sete anos atrás e hoje realizam ações conjuntas.
No segundo semestre de 2021, Edu passou três meses em Nova York para estudar inglês. Como integrante da Rede de Líderes da Fundação Lemann, aproveitou para fazer um roadshow da Gerando Falcões, junto com Jorge Paulo. O resultado foram 5 milhões de reais em investimentos que deverão entrar no caixa ao longo dos próximos três anos.
“É apenas o começo. Esperamos mobilizar muito mais recursos para investir no combate à pobreza e fazer da mudança nas favelas um exemplo para os países subdesenvolvidos”
Segundo o empreendedor social (que em 2018 publicou seu segundo livro, Da Favela para o Mundo), “é possível encarar, enfraquecer, desmantelar e vencer a pobreza antes do Elon Musk colonizar Marte!”.
Confira a conversa de Edu Lyra com o Draft:
Você já contou que o esporte — o futebol, em particular — ajudou a lhe dar um rumo, na sua infância e adolescência, para longe da criminalidade. Pode falar sobre esse período e o que de valioso você traz dessa experiência?
O futebol é um esporte de socialização que desenvolve uma série de competências de liderança, garra, competitividade, colaboração.
Eu jogava desde os 8 anos informalmente, digamos assim. Aos 13, dentro de um projeto social chamado “Ajax na Comunidade”, comecei a jogar de forma mais competitiva.
Essa integração ao esporte, dos 13 aos 17, foi uma das coisas mais importantes da minha vida. Enquanto muitos dos meus amigos foram para a criminalidade, as drogas — muitos morreram —, o tempo que eu passava nas atividades esportivas me deixava fora da influência do narcotráfico, da violência
Então isso, somado à fé, foi um pilar importante para a minha família se recompor. Fez toda a diferença na minha adolescência e juventude.
A religiosidade é um fator forte no apoio da transformação da sua família?
Na favela você tem algumas ferramentas que acabam criando um apoio familiar e desenvolvendo as lideranças. O próprio esporte, o skate, o hip hop… E a igreja tem sim uma influência crucial.
Quando você tem fé, acredita que o amanhã vai ser diferente, melhor — e se você crê nisso, não vai fazer determinada bobeira.
Eu diria que a fé está além do tema da religião. Ela foi definidora para o meu pai abandonar o crime, sair das drogas e restabelecer a vida
Então, eu também fui beneficiado. Inclusive hoje, ainda sou um homem muito influenciado pela minha fé.
Você já fazia trabalho social antes da Gerando Falcões?
Sempre fui envolvido com atividades sociais. Por exemplo, quando eu tinha 7 anos, criei um grupo teatral na escola, inspirado no filme Diário de um adolescente (1995), com o Leonardo DiCaprio.
Eu interpretava o protagonista, Jim [promissor jogador de basquete que se afunda nas drogas e, para manter o vício, rouba e se prostitui], e a gente rodava todo o sistema educacional de Guarulhos fazendo apresentações e falando do risco das drogas
Nessa fase, comecei a assumir uma liderança estudantil e a desenvolver minhas competências sociais. E isso foi crescendo, se arraigando até a minha juventude, quando assumi efetivamente o meu lugar como empreendedor social.
Você costuma dizer que o ambiente da favela ensina muito aos jovens sobre flexibilidade, solução de problemas… Nesse sentido, você teve que se obrigar a concluir o Ensino Médio?
Olha, eu não tinha outra opção a não ser concluir, porque minha mãe e meu pai, que nessa época já não estava mais preso, eram muito atuantes, sabe? Eles fechavam o cerco e jamais me deixariam desistir dos estudos.
Tem uma coisa que é o seguinte: eu vi minha mãe sofrer muito com o meu pai, ir visitar na cadeia. E eu tinha medo de fazer ela sofrer. Então, tudo que tinha possibilidade da minha mãe sofrer, eu não fazia!
Eu queria dar orgulho a ela. Sabia que largar a escola, apesar de eu não gostar tanto do modelo tradicional, iria fazê-la sofrer. Então, levei [adiante]… concluí pela minha mãe.
Os recursos para começar a Gerando Falcões vieram da venda do seu livro Jovens Falcões. Como você e os outros cofundadores (Amanda Boliarini, o rapper Lemaestro – cujas rimas falam de estudo e dignidade – e Mayara Lyra) se juntaram?
A primeira pessoa que eu recrutei foi a Amanda, ainda quando eu precisava de uma designer para me ajudar na produção do livro. Ela topou, veio atuar comigo literalmente sem ganhar um real.
Logo depois, embarcamos o Lemaestro, que largou a empresa onde ele estava, uma fábrica e, simplesmente veio me ajudar, também sem ganhar nada
(O rapper já disse publicamente que se reconectou com Edu pouco após se libertar da dependência de drogas, quando ainda lidava com as sequelas, inclusive emocionais, do vício.)
E aí na sequência chegou a Mayara, que um tempo depois viria a se tornar a minha esposa. São as três pessoas que construíram esse negócio comigo do zero e estão ao meu lado ainda hoje, fazendo toda a diferença.
Hoje, fala-se muito de equidade de gênero, de raça… A Gerando Falcões foi fundada por dois homens negros e duas mulheres brancas. Isso foi coincidência?
(risos) Eu suponho que foi total coincidência, mas tem muito a ver com o meio onde eu transito também, né? Meu pessoal, meu povo, são os negros, periféricos. E fui criado pela minha mãe, com meu pai preso.
Então, sempre acreditei muito na liderança de mulheres. Vi, desde sempre, o efeito de uma mulher empoderada. Tanto que 70% dos cargos de liderança na Gerando Falcões são ocupados por mulheres.
Quais foram os primeiros projetos tocados pela Gerando Falcões? Como foram esses anos iniciais?
Começamos eu e o Lemaestro fazendo intervenções de conteúdo social e artístico dentro das escolas. Eu dava palestra e o Lemaestro fazia uma apresentação de hip hop, trabalhando a consciência, estimulando a educação. Tanto que a gente chamava de “Ostentação da Educação”.
Aí nós criamos uma oficina de skate, com o Lemaestro. A gente utilizava o skate como meio de inclusão social de crianças e de jovens. Depois, criamos uma segunda modalidade, o futsal, também utilizando o esporte como uma ferramenta de inclusão.
Depois criamos um centro de desenvolvimento humano, integrando “tecnologias sociais” de esporte, cultura e capacitação profissional dentro da comunidade. Tinha desde aula de futsal, tênis e boxe até coral, orquestra, teatro, pintura, programação, aulas de vendas, habilidade socioemocional… Pode se dizer que assim foram os primeiros três anos.
O trabalho no terceiro setor pode ser apaixonante, mas também exaustivo. Como você e Mayara evitam cair nessa armadilha, de “fazer, fazer, fazer”— sem nunca descansar?
Se eu disser que faço isso perfeitamente, eu estou mentindo. E eu não gosto de mentir em nada na vida, mentira nunca é bom.
Às vezes, a gente vai além do que deveria ir. Eu trabalho muito, das 8 da manhã até 9, 10 da noite, com muita frequência. Isso acontece. E não é a coisa mais saudável do mundo.
Não dá para entregar a mudança que a gente quer fazer no Brasil, sem sacrifícios [pessoais] significativos. Eu sei que tem um preço a pagar
De fato, não é uma coisa trivial. Tem discussões [entre o casal]? Lógico que tem. Poderia ser diferente? Vamos dizer que sim. Mas eu não encontrei outra forma ainda (risos)!
Existe um jeito “certo” de se fazer filantropia e voluntariado? E como estruturar ações mais solidárias e efetivas sem tirar dignidade e autonomia de quem recebe ajuda?
Eu acho que Brasil e o mundo correm riscos seríssimos sob dois aspectos: social e ambiental. Nós chegamos numa encruzilhada. Todo mundo vê o que está acontecendo na Bahia, em Minas e São Paulo, correto? As coisas estão de pernas para o ar.
Todo dia é uma notícia ruim. A natureza está gritando, está passando um recado. E a gente viu a fome atingir mais de 20 milhões de pessoas! Antigamente, privilégio era ter um iPhone. Hoje em dia, o privilégio é comer!
A gente foi para um lugar de vulnerabilidade muito grande. E o voluntariado e a filantropia passam a assumir um papel crucial na agenda brasileira.
Tem uma frase da Madre Teresa de Calcutá de que eu gosto: “As mãos que fazem são mais sagradas que os lábios que rezam”. Então, é preciso fazer, colocar a mão no arado – como diz a minha mãe – e entregar o seu tempo. Isso é o que as pessoas têm de mais precioso: seu conhecimento, sua energia e o seu potencial humano…
As organizações sociais não têm todo o dinheiro de que precisam para mudar [a realidade]. Imagine que temos pouco mais de 200 funcionários para mudar 14 mil favelas… a gente não consegue! Então, primeiro, preciso de voluntários.
Segundo: preciso de filantropia. Qual é o significado ou a relevância de ser rico? Eu acho que é apoiar ideias que podem transformar. Imagina se alguém rico pudesse ter investido em uma ideia do Albert Einstein…? Uma ideia que mudasse o mundo.
A riqueza se justifica quando serve para impulsionar ideias que podem melhorar a vida das pessoas. O rico que não faz isso, que estoca o seu dinheiro só para si e suas próximas dez gerações, não é rico. Ele é pobre, tem tanto egoísmo que isso deixa ele pobre. Eu tenho dó dessa pessoa
No Brasil, há exceções, mas tem muita gente rica pensando só em si. Enquanto isso, o Brasil vai degringolando. Então, precisamos de menos ricos e de mais elite intelectual, que influencia, que muda o ponteiro. A elite lidera, é o primeiro pelotão.
A gente joga muito a culpa nos outros, nos políticos, mas todos temos culpa no cartório. Só que existe uma dívida muito grande dos mais ricos com o Brasil. E essa dívida é paga com participação social ou integração, tendo uma atuação transformadora na vida dos cidadãos do país.
Ou, como diz o Elie Horn [fundador da Cyrela, nascido na Síria e radicado no Brasil desde 1955]: “Será preciso passar a eternidade pedindo perdão aos mais pobres.”
Em 2016, a Gerando Falcões pivotou, virando uma plataforma que agrega ONGs atuantes em inúmeras comunidades e dissemina esse modelo para combater a pobreza em todo o Brasil (e não só em Poá). Nesse movimento, além de chamar o pessoal da Ambev para compartilhar conhecimento, você criou pontes entre a periferia e a “elite do bem”…
Eu sempre acreditei que essa divisão da sociedade brasileira é improdutiva e infértil. O Brasil é muito dividido por muros. Há muros demais: entre brancos e negros; ricos e pobres; direita e esquerda.
Então, desde sempre eu fui um fazedor de pontes. E a gente tem produzido uma agenda intencional com o mercado econômico, há anos, que tem entregado impacto para o Brasil e soluções.
Em 2019, nasceu a Falcons University, com intuito de formar líderes comunitários. Como se ensina liderança ali dentro?
Esse modelo de atuação que eu falava se mostrou competitivo, entregou resultados, então, entendemos que deveríamos transformar esse conhecimento em software, em tecnologia social. O que é uma tecnologia social? É como você faz.
A partir daí a gente decidiu replicar a Gerando Falcões. Mas não replicar marca, o branding, porque isso é o que menos importa! Replicar a visão, o conceito, o empoderamento, a autoestima, a coragem — um novo jeito de existir como favelado, como ser social transformador
A Falcons University é resultado de um processo de hackeamento que nós fizemos do mercado dos sistemas de gestão das grandes empresas – KPIs, cinco indicadores anuais, organograma, governança, transparência, auditoria, metas, jogar no ataque, resultado etc. – e juntamos com a nossa habilidade e sensibilidade social da ponta, capacidade de construção de participação cidadã, orquestração de território, produção de impacto, captação de recursos.
A essência do empreendedorismo social é o que a gente replica no Brasil através da Falcons.
Além de criar conexões e dar treinamento a outros líderes comunitários, você exerce um papel de ímã, de trazer pessoas (como artistas e influenciadores) para a ONG. Por exemplo, no podcast Mano a Mano com a Taís Araújo e Lázaro Ramos , ela diz que se ofereceu para trabalhar para a Gerando Falcões…
Ah, é verdade! A Taís disse que ficou encantada com a nossa agenda social, nossa seriedade, nosso trabalho, como a gente produz impacto no Brasil, e me procurou dizendo que realmente queria trabalhar para a Gerando Falcões.
A Gerando Falcões é da sociedade, ela não é do Edu. Eu estou CEO, mas é uma tecnologia social do Brasil, então ela tem que ter lugar para integração de todos – de mulher negra e rica como a Taís, que é uma exceção econômica, e de uma mulher negra e pobre, que está lá na Favela Marte, em São José do Rio Preto…
Assim como é também uma ferramenta de integração para Jorge Paulo e Suzana Lemann, esposa dele, para o senhor Elie Horn, Guilherme Benchimol, Pedro Bueno, Daniel Castanho, Flávio Augusto da Silva, que são bilionários…
A mudança começa na favela? Sim, mas o processo de mudança de um país é feito com toda a sociedade, não pode ficar ninguém de fora. Então, quando você fala em “ímã”, é porque isso é genuíno para a gente.
Vamos falar do projeto Favela 3D (Digna, Digital e Desenvolvida) que tem ações distribuídas em oito pilares (como moradia digna, acesso à saúde e direito à educação) e acaba de ganhar o reforço de um produto cocriado com a Nestlé, cuja renda é revertida para o programa… Há também a criação de um aplicativo para coleta de dados sociais – o “Programa Decolagem” com apoio da Accenture e da Fundação Lemann, certo?
O aplicativo está em produção, o nosso time fez o kick off desse projeto em meados de janeiro.
O programa venceu um desafio de inovação para os membros da Rede de Líderes Fundação Lemann e recebeu o aporte de 1 milhão de reais para o pontapé inicial. Mas é um investimento de milhões de reais da Fundação Lemann, da Accenture e também da Gerando Falcões para construir essa tecnologia com inteligência de dados.
Tudo que tem por trás de empresas como Amazon, Netflix, etc. – o estado da arte da tecnologia – vai ter nessa tecnologia do Programa Decolagem. Vamos usar “ciência de foguete” para transformar a pobreza em peça de museu
Quando se fala de captura de dados, entendemos que precisamos fazer o levantamento de dados da geografia física, social e humana da favela. Esses três componentes nos dão a fotografia de qual fio a gente tem que cortar para desligar a bomba-relógio da pobreza — antes que ela exploda.
O Programa Decolagem é uma trilha. A gente constrói trilhas individualizadas de superação da pobreza para cada família, usando muita tecnologia e gestão humana, para que em um a dois anos essas pessoas tenham aquilo que a gente chama de emancipação social e consigam sair da extrema miséria para a pobreza e, depois, da pobreza para autossustentabilidade financeira.
Temos um recurso investido em dados, em plano de internet — e, para quem precisa, a gente libera a internet e também apoia com celular.
O Favela 3D iniciou na comunidade da Vila Itália, rebatizada de Favela Marte, em São José do Rio Preto (SP) em parceria com a prefeitura, o governo do Estado, o Instituto As Valquírias e a população local, mas já tem acordos assinados para chegar a outras comunidades (em Maceió, Rio de Janeiro e São Paulo). A ideia é formar um data lake com dados para apoiar iniciativas personalizadas em cada comunidade? Existe um pilar central?
O primeiro pilar é o social, mas temos duas abordagens no projeto. A primeira é o hardware, que é tudo que é obra física e infraestrutura. A segunda é o software: o desenvolvimento humano.
Antes do hardware, a gente começa com software, que é a inteligência socioemocional e as trilhas de desenvolvimento com capacitação para que as pessoas possam ter a inclusão econômica da sua vida produtiva, gerar renda e sair da pobreza.
Em São José do Rio Preto, já temos 100% das famílias embarcadas no Programa Decolagem e quase um terço da população já empregada no ano de 2021
O que isso significa? Que o aspecto social e humano é a grande prioridade dentro do processo de transformação nas favelas.
Que tem a ver com autoestima e até a vontade da pessoa circular para fora da comunidade, de arranjar trabalho que pode ou não ser lá dentro…
Exatamente. O grande aspecto da agenda da Favela 3D é a favela se levantar contra a pobreza. E o que isso significa? Que nenhuma solução pode ser como um “pastel pronto” que você entrega na mão do cidadão. Ele é cocriador, a solução é construída junto com a favela na ponta.
Temos o desenho de uma mandala que é o plano de desenvolvimento social, todas as soluções que vão ser inseridas dentro da favela. Esse plano é feito e produzido na favela e com a favela.
Sabe aquela história de a política pública cair como um meteoro dentro da favela ou de um político ter uma ideia no seu gabinete e descê-la goela abaixo… Isso destrói a autoestima de uma comunidade. Ela se sente por fora, com a sua inteligência subestimada…
Ninguém no mundo conhece mais da favela que o favelado, ele é o maior especialista. O ângulo que ele tem do território, das vulnerabilidades e da potência da favela é o estado da arte do conhecimento.
Esse processo de cocriação leva mais tempo, precisa de paciência. Por isso que geralmente pulam essa etapa. Mas quando você faz todo esse processo, resgata a autoestima da favela.
A gente se recusa a iniciar qualquer processo de transformação sem a liderança local. Na favela Marte é a Amanda Oliveira, a CEO do Instituto As Valquírias, que é integrante da Rede Gerando Falcões. Ela é uma das grandes líderes hoje no nosso país, e está conduzindo esse processo.
Percebe que é uma mudança de dentro pra fora, de baixo pra cima? Não é a favela no chão caída, pedindo esmola. É uma favela de pé, propondo um acordo com o Brasil
A Favela Marte vai ser a primeira favela do mundo autossustentável em energia, com produção de energia solar; 100% das casas terão instalação de placas fotovoltaicas. Percebe que é entregar o melhor para quem é pobre?
Isso vai acabar fazendo as pessoas pensarem também em descarte de lixo, certo?
Total! Combate à pobreza e proteção e sustentabilidade ambiental andam juntas. Então, as nossas favelas 3D são bases de lançamento de tecnologias do futuro, que vão mudar a ordem das coisas.
O que a gente quer é comprovar essa tecnologia. Tanto que nós contratamos a Kayma, do Dan Ariely [israelense especializado em economia comportamental], para fazer toda a avaliação de impacto, comprovar com evidências de que funciona — e replicar isso em escala.
Você já disse que não tem ambição em seguir carreira política. Por outro lado, fez uma autocrítica em relação a não ter dado atenção à mobilização da classe política nas ações. Como você pensa em mudar isso e impactar também esse grupo?
O establishment político no Brasil não inova, porque é muito grande e pesado. A oportunidade que o terceiro setor tem é de produzir tecnologias inovadoras e oxigenar o Estado brasileiro. E, como consequência, influenciá-lo a tornar essas tecnologias em políticas públicas que possam mudar o rumo das coisas.
O nosso papel como Gerando Falcões é ser essa influência, é mostrar que é possível a partir da atuação localizada, no território, na ponta, lá na favela, lá no CEP, no CPF. É isso que a gente vai fazer nos próximos três anos.
A cada ano, vamos entregar um modelo diferente de mudanças sistêmicas em favelas brasileiras. E acredito que isso tem o poder de redefinir como governos e sociedades vão intervir dentro desses territórios sociais, redefinir a relação de governos e favelas
A partir da produção desses cases e da evidência, nós vamos influenciar políticas públicas em governos de todo o Brasil. Pra entregar esse sonho, contamos com a doação de milhares de pessoas: já temos mais de 2 mil [doadores], e queremos chegar a 10 mil até o final deste ano.
Em 2023, para cada real de lucro, a MOL Impacto destinou 5 reais a organizações sociais. Roberta Faria fala sobre a cultura de doação no Brasil e como sua empresa engaja consumidores através do varejo para ajudar a construir um mundo melhor.
Desconstruir mitos e fórmulas prontas, falando a língua de quem vive na periferia: a Escola de desNegócio aposta nessa pegada para alavancar pequenos empreendedores de São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo.
Filha de missionários, a colombiana Lina Maria Useche Kempf veio viver em Curitiba aos 12 anos. Ela conta como cofundou a Aliança Empreendedora para impulsionar a prosperidade por meio do estímulo a microempreendedores de baixa renda.