Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…
BIOMIMÉTICA
O que acham que é: Uma ciência recém descoberta.
O que realmente é: Biomimética (Biomimetics ou Biomimicry, em inglês) é a ciência que observa fenômenos e processos da natureza, utilizando seus mecanismos para inspirar soluções que beneficiem o cotidiano das pessoas. Em outras palavras, a Biomimética se inspira em elementos da natureza (como formas, funções e sustentabilidade) para desenvolver projetos dos mais variados tipos em áreas que vão da indústria têxtil à inteligência artificial, passando por nanotecnologia e robótica.
Um dos exemplos mais antigos da utilização da Biomimética é o velcro (aquele fecho de duas partes que “grudam” uma na outra). Seu criador, o engenheiro eletrônico suíço Georges de Mestral, decidiu entender como carrapichos aderiam aos pelos de seu cachorro. Por uma análise microscópica, percebeu que a semente dessa planta tem filamentos entrelaçados, com pequenos ganchos na ponta, e aplicou a mesma lógica em material plástico, dando origem ao velcro em 1907.
Giane Brocco, especialista em Biomimética pelo Biomimicry 3.8, nos Estados Unidos e fundadora da consultoria Biomimicry Brasil, diz que a Biomimética tem resultado desde que se faça a pergunta certa à natureza. “O princípio dessa ciência é o questionamento ‘O que a natureza faria aqui?’”
Segundo o biólogo Ney Mello, professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coautor da série sobre Biomimética O que é, o que é, no Canal Futura, a Biomimética parte do princípio de que todas as soluções já estão presentes na natureza — se descobrimos seus princípios, podemos utilizá-los de outras formas a nosso favor. “Nós já copiamos muitos deles e colocamos no nosso cotidiano, criando tecnologias inovadoras que têm facilitado nossa vida.”
Mello cita alguns exemplos como displays sustentáveis inspirados nas asas de borboletas do gênero Morpho, os nanoimplantes cerebrais fundamentados no estudo de pepinos-do mar, as turbinas eólicas baseadas nas baleias-jubarte e os coletores de água, em besouros.
Quem inventou: O termo Biomimética foi cunhado pelo engenheiro americano Otto Schmitt em substituição ao usual, até então, bionics, que designava, segundo seu criador, o psiquiatra e engenheiro Jack Steele, “a ciência dos sistemas que têm algumas funções copiadas da natureza”.
Mas a existência da Biomimética é anterior aos termos e, ainda, à criação do velcro. É possível voltar à Leonardo da Vinci (1452–1519) que, atento observador da anatomia e do voo dos pássaros, fez inúmeras anotações e esboços de máquinas voadoras. Há ainda diversos outros nomes de estudiosos na história.
Quando foi inventado: O termo, 1969. Em 1974, entrou para o Dicionário Webster. Bionics foi cunhado em 1960.
Para que serve: Para a criação de projetos, produtos, soluções etc em diversas áreas dentre as quais tecnologia, design, engenharia, medicina, mobilidade urbana, de produção de energia limpa e renovável e esportes de alto rendimento. A Biomimética está cada vez mais atrelada à sustentabilidade e muitas das suas criações visam substituir métodos que degradam o meio ambiente por outros mais “limpos”.
De acordo com Brocco, a Biomimética utiliza a natureza como fonte de criação e inovação e, como é abundante em recursos e inspirações inovadoras e sustentáveis, permite que a vida prospere na Terra. “Por sua abordagem transdisciplinar, pode conceber materiais como revestimentos autolimpantes que funcionam como as folhas da flor de lótus, plásticos que se autorregeneram como a pele humana, fibras mais resistentes que o nylon, inspiradas nas teias de aranha, e adesivos super aderentes baseados nas microestruturas dos filamentos das patas das lagartixas”, diz.
Mello conta que a bióloga Janine Benyus, uma das pesquisadas que mais popularizou a Biomimética no mundo, alerta que uma coisa é aprender sobre a natureza, outra, é aprender com a natureza. “É desta mudança de pensamento que a humanidade precisa. A Biomimética conecta o mundo natural à nossa 4ª Revolução Industrial, que traz muitas tecnologias como soluções inovadoras.”
Robôs, cujos movimentos são inspirados na propulsão de protozoários, padrões de sinalização para mobilidade urbana entre veículos e pedestres baseados no comportamento de formigas (que diminuem índices de acidentes) e inteligência artificial criada a partir do comportamento de cardumes são algumas criações que utilizaram Biomimética, de acordo com Mello. “Há, ainda, o comportamento de abelhas que apresentam algoritmos capazes de melhorar a transmissão de informações pela internet, os fungos que inspiraram a criação de concreto vivo auto-recuperável e super filtros de água inspirados nos complexos de raízes de manguezais”, afirma. Já o movimento das asas libélula inspiraram os estudos de micro veículos aéreos não tripulados, os BMAVs.
Quem usa: Empresas como Ford, Coca-Cola, General Eletrics, Natura, Procter & Gamble, Levi’s, Nike, Colgate-Palmolive e Boeing já desenvolveram produtos com a utilização da Biomimética.
Brocco cita a empresa alemã Arnold Glass que, para resolver o problema da colisão de pássaros com vidros de arranha-céus (mais de 100 milhões morrem por ano na Europa) estudou grandes florestas e observou que as aves não colidiam com teias de aranha porque há uma fibra nelas que reflete luz ultravioleta (invisível ao olho humano). “Baseada nesse conhecimento, a empresa aplicou fibras ultravioletas em uma linha de seus vidros, preservando a transparência mas evitando a morte dos pássaros”.
Mello conta que a multinacional ARUP constrói edificações sustentáveis. “Ela construiu um shopping center no Zimbábue com sistema de ventilação inspirado em cupinzeiros, que utiliza até 10% menos energia pela economia com ar condicionado.”
Efeitos colaterais: Uso para fins negativos.
Mello conta que o maior efeito colateral dos avanços crescentes da Biomimética é sua aplicação em guerras e conflitos. “Como acontece com toda tecnologia, suas inovações podem ser utilizadas com fins pacíficos ou devastadores. Por exemplo, superfícies inspiradas em folhas de plantas, e por isso mais lisas, podem tanto melhorar a captação de água em uma tribo africana como serem usadas para facilitar o voo de um míssil que explodirá uma cidade na Síria.”
Quem é contra: Não há.
Para saber mais:
1) Leia, na Fortune, 5 Trends to Ride in 2017 — Your business and career will benefit if you strategically pursue the smartest of today’s ideas. O texto cita a criação de protetores solares feitos a partir da emulação do suor de hipopótamos — são sem cheiro, vale frisar.
2) Assista aos TEDs Biomimicry’s surprising lectures from nature’s engineers (2004) e Biomimicry in action (2009) de Janine Benyus, bióloga e cofundadora do Biomimicry Institute.
3) Ouça, na Forbes, o podcast Billy Almon On Biomimicry And The Innovation Of Nature. Designer, Almon diz que o entendimento da Biomimética é “quando você não vê mais um pássaro (apenas) como um pássaro mas como um mecanismo multifuncional de inovação”.
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