Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…
ESPECISMO
O que acham que é: Conceito que valoriza todas as espécies vivas.
O que realmente é: Crença ou ideia de que a espécie humana é moralmente superior às demais espécies podendo, por isso, dispor de sua existência.
O conceito é pouco conhecido e talvez a maioria das pessoas (que, neste caso, é a maior parte da humanidade!) não se dê conta mas, na prática, o Especismo é a ideia que sustenta o uso de animais em indústrias como a alimentícia (carnes e derivados), têxtil (couro, lã, pluma, seda etc.), cosmética e farmacêutica (em ambas, tanto como ingrediente como para testes). Há muitas outras.
Para a advogada e socióloga Bruna Graziuso, formada em Bioética pela Universidade de Yale (EUA), o especista utiliza uma suposta inferioridade moral dos demais animais para justificar seu domínio sobre eles. “O Especismo é mais um entre outros “ismos” de dominação, como o racismo e o sexismo, por exemplo. Todos funcionam segundo a lógica da discriminação injustificada, seja com base em gênero, raça ou espécie”, afirma.
Existe ainda um outro “ismo” com o qual o Especismo tem relação, mas por oposição: o veganismo. Salvo desavisados que se autodenominam veganos em razão das suas dietas, o veganismo é uma escolha de vida que exclui (até onde é possível) todas as formas de exploração e crueldade contra animais, o que envolve, além da comida, também vestuário, produtos (higiene, beleza, limpeza da casa etc.) e qualquer outro propósito.
Origem: O termo Especiesism foi cunhado pelo psicólogo, defensor do direito dos animais e escritor inglês Richard D. Ryder, no começo dos anos 70. A expressão se tornou popular, no entanto, por causa da já clássica obra Animal Liberation, do filósofo australiano Peter Singer, lançada em 1975.
Contexto atual: Há pouco menos de dois meses, quando o filme Coringa estreou nos Estados Unidos, seu protagonista, o ator Joaquin Phoenix, estampava um outdoor, em Nova York, defendendo o fim do Especismo. Criada pela PETA, organização americana de direito dos animais, a peça mostrava um close do rosto do ator com o olho esquerdo sobreposto por o de um galo e dizia (aqui, em tradução livre): “Somos todos animais. Dê fim ao Especismo. Seja vegano”. Phoenix é vegano desde os três anos de idade.
Sobre os ossos dos mortos, obra mais recente da escritora polonesa Olga Tokarczuk, que ganhou este ano o Nobel de literatura referente a 2018 (não houve premiação naquele ano), tem sua trama toda costurada pela ideia do Especismo.
Autoproteção: Um argumento a favor do Especismo, segundo o verbete The ethics of speciesism publicado pela BBC (link no item “Para saber mais), diz ser biologicamente natural tratar a própria espécie de maneira favorável e que também os animais não humanos, em sua maioria, agem dessa forma.
Antiespecismo: Além da adoção do veganismo como posicionamento político, o ativismo a favor da libertação animal envolve boicotes a locais e eventos em que bichos são mantidos em cativeiro e usados para fins de entretenimento (circos, aquários, zoológicos, passeios de charrete etc.), às empresas que os patrocinam, a lojas que comercializam pets. Denúncia de maus tratos a animais grandes (rodeios e vaquejadas), domésticos (criadores), comércio ilegal e manutenção de aves em gaiolas são outros exemplos, mas não para por aí.
Segundo Graziuso, a conscientização pela informação continua sendo fundamental. “Empresas de tradição e prática não-veganas têm lançado linhas de produtos vegetais com apelo vegano. “Elas aproveitam desse nicho de mercado enquanto seguem explorando animais em sua produção. É preciso entender que esse veganismo pragmático, de mercado, não leva à libertação animal.”
Especismo de pet: Há quem veja uma graduação no conceito de Especismo na qual animais domésticos seriam superiores aos demais animais.
Sônia T. Felipe, doutora em filosofia moral e teoria política, chama essa distinção de “postura anti-especista elitista, marcada pelo especismo eletivo”. “Passamos a defender os animais escolhendo os que julgamos mais adequados à expressão de nossa necessidade afetiva, estética, econômica etc. Elegemos, então, certos animais, de acordo com nossa predileção. Por isso os chamamos de ‘animais de estimação’”, diz no artigo Dos Direitos morais aos Direitos Constitucionais, Para além do especismo elitista e eletivo.
Para isso, o professor, filósofo e advogado americano Gary Francione cunhou o termo Esquizofrenia Moral.
Graziuso fala que fomos ensinados a socializar com alguns animais e a nos alimentarmos de outros, assim como a admirar pássaros no céu e comer asas de frango. “Mas não há qualquer diferença entre um porco e um cachorro, há apenas a nossa própria hipocrisia.”
Para saber mais:
1) Leia, na BBC, The ethics of speciesism.
2) Leia, no site do PETA, Joaquin Phoenix Reminds Everyone That ‘We Are All Animals’.
3) Na Folha de S.Paulo, Leia trecho inédito de romance de Olga Tokarczuk, vencedora do Nobel.
4) Leia, no Guardian, All beings that feel pain deserve human rights, artigo de Richard Ryder.
5) Leia, no Justificando, Por que falar em especismo?