Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete deste mês é…
PROTEÍNA DE INSETO
O que é: Derivada de insetos como besouros, gafanhotos, grilos e larvas de farinha, é considerada uma fonte de alimento alternativa e sustentável num momento de crise climática, que pode dificultar a distribuição e disponibilidade de comida. Os insetos comestíveis são seguros e apresentados de diversas formas: em pó, inteiros, como ingredientes em alimentos processados ou em rações para animais.
Segundo a ONU, uma das principais defensoras dessa alternativa, o percentual de proteína em alimentos à base de insetos pode chegar a 69% (um artigo publicado na Nature vai além e fala em até 75%, superando o de proteínas animais, 12% a 34,5%, e vegetais, 7% a 50%). Fora a proteína, os insetos fornecem outros nutrientes importantes como biotina, cálcio, cobre, ferro, fósforo, magnésio, manganês, selênio, zinco, gorduras boas, entre outros.
De acordo com a ONU, hoje 2 bilhões de pessoas em 130 países já consomem esse tipo de alimento como complemento em suas dietas. O tamanho global desse mercado foi avaliado em cerca de 3 bilhões de dólares em 2023, segundo o Business Research Insights.
Origem: O consumo de insetos, chamado de entomofagia, é uma prática milenar em muitas culturas, especialmente na África, América Latina e Ásia. Vide que em algumas regiões do Brasil, o preparo de petiscos ou farinha feitos de formigas tanajura é comum. E tem até restaurante famoso que já encabeçou esse prato, como o paulistano DOM, de Alex Atala.
Mas o assunto ganhou repercussão mundial quando, em 2013, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura lançou um programa para incentivar o consumo de insetos, apontando a prática como uma forma de promover a segurança alimentar e combater a fome. Segundo a organização, são mais de 2 mil tipos de insetos comestíveis. Depois disso, algumas universidades, startups e empresas de alimentos começaram a explorar esse universo.
Com o passar do tempo, a ONU reafirmou sua aposta no tema e, em 2023, na iniciativa Compromisso Global de Metano, o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola, Ifad, firmou uma parceria com Estados Unidos e com os países da COP27 para mitigar as mudanças climáticas e promover a segurança alimentar; e uma das propostas para isso foi justamente incentivar a produção e consumo de insetos como comida para seres humanos e animais.
As startups que apostam em proteína “voadora”: Criar insetos para a alimentação já é uma prática mais difundida nos EUA, Europa e Ásia, onde há regulamentação para a criação, produção e comercialização desse insumo e é possível encontrar desde espetinhos de insetos em barraquinhas na rua a opções industrializadas no mercado.
Já existem diversas startups apostando neste setor e chamando a atenção de fundos. Em 2023, por exemplo, a francesa Ÿnsect, considerada pioneira no setor, captou 175 milhões de dólares. O negócio desenvolveu quase 400 patentes, em diferentes categorias, para uso dos insetos. A startup cria essas proteínas para ração animal, fertilizantes e alimentos para consumo humano (o pó à base de larva do besouros pode ser usado para enriquecer o preparo de bolos, pães e massas).
A também francesa Jimini’s vende de barrinhas a bolachas e macarrão feitos à base de insetos. Já a estadunidense Mighty Cricket transforma grilos em proteínas em pó saborizada. E a canadense Wilder Harrier vende petiscos à base de grilos para pets e ração seca de larva de mosca-soldado preta e grilo. Enquanto isso, a sueca BugBox desenvolve tecnologia industrial, modular e totalmente automatizada de criação de insetos para produção sustentável de proteínas.
Não são só as startups que apostam no setor, grandes empresas como a Mars, no Reino Unido, vendem ração seca para gatos com larva de mosca-soldado preta (linha LoveBug). Uma das maiores produtoras de carne dos EUA também está apostando nos insetos comestíveis. Em outubro do ano passado, a Tyson anunciou que investiu recursos em uma fabricante de insetos para ração animal, a holandesa Protix, e irá construir uma fábrica da empresa nos Estados Unidos. O intuito da Tyson é ter uma alternativa para a alimentação animal
No Brasil, de chocolate de besouro a hambúrguer de grilo: Por aqui, não é proibido comer insetos, mas sua produção em escala para consumo humano ainda não foi autorizada pela Anvisa (o país soma 140 espécies de insetos comestíveis).
Independente disso, já existem startups e pesquisas dedicadas a esse setor. A gaúcha Insect Protein foca em três produtos: larvas desidratadas para consumo de animais (peixes, répteis, anfíbios, pássaros e aves); farinha integral de besouro (usada na alimentação de peixes, répteis, anfíbios, pássaros e aves, mas também cães, gatos e suínos) e fertilizantes orgânicos produzidos pelas larvas de insetos.
Outra startup nacional com esse enfoque é a Cyns, que produz farinha à base de mosca-soldado negro para o mercado de aquarismo e animais exóticos, mas em março recebeu um aporte (de valor não revelado) da multinacional Sumitomo Corporation para expandir sua produção para outros mercados, como o pet.
Um hambúrguer de farinha de grilo também é uma criação brasileira. O alimento está sendo desenvolvido por pesquisadores de universidades de São Paulo (Esalq) e Mato Grosso (Unemat), que buscam realizar testes de esterilização dessa farinha e melhorar seu processo de produção. Entre as vantagens do hambúrguer de grilo estariam um maior nível proteico, ação antioxidante, produção com menor custo e menos impacto ambiental.
Uma outra pesquisa mira a fabricação de chocolates com insetos. O pesquisador por trás desse produto é o Dr. Antonio Carlos Souza, do Núcleo de Ciência e Tecnologia de Alimentos do Iepa, no Amapá. Ele está desenvolvendo o “choconébrio”, mistura de chocolate, larvas de besouro (cujo nome científico é tenébrio), água e farelo de milho
Mais teor protéico e menos recursos hídricos, ração e terra: Dentre os benefícios de consumir insetos, além do maior percentual de proteína do que o obtido em carnes e vegetais, outro ponto importante é a sustentabilidade por conta da sua criação emitir menos gases de efeito estufa do que outras fontes de proteína animal e exigir menos recursos hídricos e de terra, além de menos ração.
De acordo com um estudo citado no artigo já mencionado da Nature, grilos precisam de 12 vezes menos ração do que o gado para produzir a mesma quantia de proteína, quatro vezes menos do que as ovelhas e duas vezes menos do que os porcos e frangos.
Já em termos de eficiência de recursos, o mesmo documento diz que 1 kg de carne bovina requer 3 mil vezes mais água e mais áreas para criação do que o necessário para produzir 1 kg de grilos. Mais um ponto importante em termos de sustentabilidade é que alguns insetos, como a mosca-soldado negra, conseguem converter resíduos orgânicos em fertilizantes
A produção de insetos também é apontada pela ONU como uma oportunidade econômica, sendo fonte de renda para quem decide apostar nesta criação, que não precisa de grandes estruturas para prosperar.
Superando o nojinho: O principal desafio desse mercado é a barreira cultural e o nojo. O gosto e a textura também podem afastar possíveis interessados.
Outro desafio é a produção em escala. A quantidade de insetos que seriam necessários matar para alimentar as pessoas é um ponto destacado pela bióloga Ellen Augusta Valer de Freitas em uma reportagem no portal Terra.
Na entrevista, ela disse que seria mais fácil considerar como alternativa proteica os vegetais. Ela também alertou para o fato de alguns insetos conterem bactérias nocivas aos seres humanos e pigmentação e estruturas pouco palatáveis e que podem inclusive causar alegrias.
Mais insetos nas prateleiras: O mercado de proteínas de insetos deve atingir aproximadamente 22 bilhões de dólares até 2032, segundo o Business Research Insights.
É esperado que a gama de alimentos criados dessa maneira aumente, que as empresas melhorem sua palatabilidade e aparência e que essa alternativa ajude o mundo a depender menos da proteína animal.
Para saber mais:
1) Leia o relatório da FAO: “Edible insects Future prospects for food and feed security”;
2) Acesse o relatório da nature: “The global atlas of edible insects: analysis of diversity and commonality contributing to food systems and sustainability”;
3) Confira o artigo da Bloomberg Línea: “Insetos eram o alimento do futuro. Mas acabaram nas prateleiras de produtos para pets”;
4) Leia o artigo do canal de notícias da ONU: “Agência da ONU aposta na alta de ofertas de comida à base de insetos nos supermercados”.
Junto com a temperatura global e o nível dos oceanos, a crise climática faz subir a demanda por profissionais que ajudem a preservar o meio ambiente. Entenda quais são os empregos disponíveis na área e as habilidades procuradas pelo mercado.