Como acontece há anos na capital portuguesa, foram dias intensos de debate sobre o futuro no Web Summit Lisboa. Mas o maior evento do mundo sobre inovação não focou apenas em tecnologia. Olhando para frente, as pessoas estão no centro dos debates, afinal, são elas que irão usufruir dos resultados e fazer o sistema ser sustentável. Até porque, no fim das contas, a tecnologia é usada em prol da vida em todos os aspectos.
Mais de 71 mil pessoas participaram da conferência que contou com 1050 palestrantes. Denis L. Balaguer, Diretor de Inovação e do wavespace da EY para LAS, que acompanhou o encontro, reforça a importância do público:
“Estamos falando da coalizão criativa de diferentes ângulos de inovação personificada no público do evento. Estiveram presentes os mais variados perfis: criadores de startups, pessoas com visões mais estratégicas de negócio em grandes corporações, profissionais de tecnologia, outros com visão de gestão de inovação… Enfim, é bacana ver esse cruzamento de perspectivas diferentes sob o mesmo problema”.
Além do mix de pessoas e da pluralidade de ideias, o Web Summit veio como uma mostra dos pedaços de futuro que estão espalhados pelo mundo.
“Gosto muito da frase do autor de ficção científica William Gibson que diz que o futuro já está aqui, só que não igualmente distribuído. Em poucos dias de Summit são condensadas uma série de coisas que precisariam de muito tempo e energia para que conseguíssemos encontrá-las”, explica Denis.
E tudo o que está ali fala algo sobre o futuro. “O Web Summit não é exatamente o mainstream, ele está mais no meio do caminho. O observador de grandes movimentos consegue entender que o que é apresentado está na transição, começando a ganhar tração e, talvez, daqui um ou dois anos esteja materializado, no mainstream corporativo, nas empresas, incorporado em produtos”, aponta Denis.
Não tem como falar de inovação sem startups – e elas estavam em peso na conferência, que é uma grande vitrine para esse segmento. Só que a maré andou revolta para elas, principalmente no final do ano passado com algumas demissões em massa, reflexo da economia.
“A verdade é que as startups viveram um período de investimentos gigantescos e agora devem passar por um enxugamento. E, ultrapassado esse período, o ecossistema voltará mais robusto e mais sólido”, aponta Denis.
Ficarão as que têm mais capacidade de entregar valor. Nessa esteira, o Diretor de Inovação da EY faz um paralelo com o estouro da bolha das empresas PontoCom, quando quebraram mais de 500 que eram baseadas na internet. Mas aquelas que souberam ser resilientes e se adequaram saíram vitoriosas. É o caso de Amazon e Ebay, por exemplo.
“Não é difícil imaginar que as empresas que estarão brilhando lá na frente serão as que agora estão em modo sobrevivência. Vão se dar bem aquelas que conseguirem ter a cabeça fria e saber que é preciso enfrentar a dificuldade sem matar o futuro”, avalia.
E é possível ainda ter um olhar muito otimista nesse cenário: sorte do mercado como um todo, que ganha o conhecimento estabelecido. Acontece que profissionais que eram disputadíssimos entre as startups agora estão disponíveis e, possivelmente, irão buscar uma recolocação em empresas tradicionais de diversos setores. Assim, carregam todo conhecimento de tecnologia, ferramentas e tudo o que aprenderam, espalhando novas visões estratégicas, aumentando o espaço de oportunidades de navegação em outros negócios.
A agenda está sendo posta como ainda mais urgente. E é possível enxergar muitas oportunidades para novos negócios em uma série de aspectos, da descarbonização ao reúso de produtos, até a eliminação ou substituição de fontes não renováveis.
“Há uma janela de oportunidades para modelos de negócios que levem em conta a necessidade de dar fôlego à Terra”, aponta Denis.
E o evento discutiu desde os processos mais óbvios, que estão sendo colocados em prática hoje, como aplicação de inteligência artificial para otimizar cadeias logísticas e diminuir desperdício, até novos modelos de produção de alimentos que devem se consolidar mais adiante, como sintéticos e plant based, passando por temas emergentes como tecnologias de captura de carbono. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, até 2050 a produção de alimentos vai precisar aumentar em 70% para suprir a demanda da população, o que seria insustentável levando em conta os processos atuais. Outra tendência que se apresenta nesse novo cenário são as fazendas verticais em espaços urbanos, que diminuiriam os impactos com logística, mudança de operação e por aí vai.
A jornada é longa, mas a fundação está estabelecida. Hoje o Metaverso já é uma realidade, mas há um caminho a percorrer para aplicação em grande escala. E o primeiro passo foi dado no Web Summit, com o anúncio da criação da Open Metaverse Alliance (OMA3), que busca criar padrões de interoperabilidade entre as plataformas.
“Nessa trajetória, os custos devem diminuir e a qualidade deve aumentar. Há um descompasso entre a expectativa que se criou e a realidade, mas a importância da imersão está consolidada”, aponta Denis.
Já existem aplicações com proposta de valor clara, como os jogos, no mercado de consumo, e os treinamentos e simulações de processos industriais, nas grandes empresas. E a entrada da geração Z na força de trabalho deve estimular ainda mais a inserção do Metaverso nas companhias.
Ao colocar as pessoas no centro, o Web Summit discutiu o desafio de sustentabilidade do modelo de trabalho como está colocado atualmente.
“Não se falou em descartá-lo, mas é necessário maturá-lo. A proposta, para o longo prazo, é sedimentar o aprendizado até aqui e, ao mesmo tempo, dar continuidade à inovação. Nesse sentido, falamos de regulamentação e evolução dos novos modelos de trabalho. Houve um efetivo ganho de oportunidade econômica, por um lado, e da conveniência do outro. O desafio é vencer as assimetrias do modelo atual e construir uma abordagem que seja sustentável”, afirma Denis.
Afinal, a máquina vai substituir o homem? A pergunta vem sendo feita desde a Revolução Industrial. E a resposta está na nossa caminhada.
“Sou um otimista no longo prazo. As tecnologias estão empoderando pessoas para trazerem o que é único delas. Porque se pararmos para pensar, tem muita gente fazendo trabalho de máquina, o que é brutal. Nesse ponto, a tecnologia vem para libertá-las, fazendo emergir trabalhadores criativos, que usem seu potencial, colocando-os em um papel mais humano”, defende Denis.
Essas ferramentas se colocam como empoderadoras para a relação do consumo e para relação da produção.
“Não existe um sistema social ou econômico que funcione de forma autômata, sem interação humana, não faz sentido. Olho especialmente as tecnologias de base digital como tecnologias que libertam o potencial humano”, aponta.
É lógico que aí se apresentam uma série de desafios, que implicam em mudanças profundas que vão exigir uma transição na própria estrutura da sociedade.
“Por causa disso, é importante para nós, atores dessa revolução e da inovação, trabalhar sempre por esse ângulo humano”, diz.
O uso dos robôs é uma realidade cada vez mais presente, seja no campo, substituindo o homem em trabalhos de risco e cuja mão de obra está escassa, seja no dia a dia, em aplicações específicas, até mesmo em tarefas domésticas. No médio prazo, essas tecnologias tendem a reduzir custos, viabilizar a escalada da inovação, trazendo os robôs de casos de uso corporativos para aplicações cotidianas, aumentando a digitalização mundial. No longo prazo, especialistas vislumbram a computação quântica e as novas abordagens de inteligências artificial, junto com novos dispositivos e sensores, direcionando um salto de desempenho na robótica, que tem potencial para desempenhar papel fundamental, inclusive no combate à mudança climática.
A inovação está de mãos dadas com a transição energética e redução do consumo de carbono. Nesse cenário, as climate techs receberão cada vez mais investimentos. No médio prazo, será obrigatória uma mudança da estrutura da economia, que deve ter um desenho de arquitetura diferente, assim como ocorreu nas revoluções industriais anteriores.
E Denis aponta para uma convergência das tendências apresentadas:
“Quando olhamos para a produção de alimentos de proteína sintética, uma das barreiras é a energia. Porém, quando se tem energia solar barata, o maior produtor de proteína pode ser o norte da África, onde hoje não se planta quase nada, por exemplo, mas possui uma grande insolação e, portanto, potencial de geração de energia renovável. Novos desenhos geopolíticos se mostram”.
E as tendências vão se acoplando para construir uma visão de um mundo em transição.
“Gostei muito do conceito que ouvi: estamos descomissionando o modelo econômico da revolução industrial anterior para construir um novo. Isto impulsiona toda uma agenda de inovações radicais”, conclui.
Para conhecer mais profundamente as tendências apresentadas no Web Summit Lisboa, baixe o e-book produzido pela EY.
Será preciso se reorganizar, mergulhar na tecnologia e aprender a lidar com os dados que vão permear todo o ecossistema de saúde. Especialistas da EY explicam como isso já vem sendo realizado lá fora e como deve entrar no Brasil.