“Inspirar e transformar vidas por meio de viagens”: essa é a missão do Hotel Urbano, marketplace para turismo criado em 2010 pelos irmãos cariocas José Eduardo, o Duda, e José Ricardo Mendes. A sacada surgiu quando Duda, numa viagem a São Paulo, percebeu que não havia um portal que facilitasse encontrar leitos disponíveis em hotéis.
O Hotel Urbano deu tão certo que a veia empreendedora dos irmãos não parou de pulsar. Eles passaram a vender partes do empreendimento para outros investidores e, em 2015, quando a concorrência desse tipo de serviço se acirrou no Brasil (na época, o Hotel Urbano atendia um milhão de clientes), a dupla anunciou que havia vendido o controle da empresa à americana Insight.
Duda diz que esse momento foi o mais desafiador da trajetória, e o que proporcionou mais aprendizado. Os irmãos Mendes, porém, não ficaram longe por muito tempo, retornaram ao negócio e hoje, graças a um modelo horizontal de liderança (baseado em empoderar os funcionários para a tomada de decisões), o Hotel Urbano vive ótima fase.
(Atualização: no finzinho de julho, o Hotel Urbano anunciou uma mudança de marca – a empresa agora se chama Hurb.)
Co-estrela da campanha de lançamento da loja da Oficina (marca do Grupo Reserva prestes a abrir no Shopping Leblon, no Rio), Duda, 35 anos, deu esta entrevista a Phydia de Athayde, editora-chefe do Projeto Draft:
Por que você acha que está nessa campanha?
Acho que estou aqui para contar sobre os desafios de empreender no Brasil. Temos uma visão de que empreender seja um processo contínuo e eterno de descoberta, mas acho que é, também, de redescoberta diária.
Você se lembra o que te levou a empreender?
Eu era novo, estava começando o curso de Administração, tinha um emprego para pagar a faculdade e vi uma oportunidade de negócio. A partir disso, comecei a entender que quando ganhamos confiança, começamos a desenvolver negócios um atrás do outro, isso se torna uma “cachaça”.
O Hotel Urbano inovou com uma maneira diferente de oferecer serviço, táticas agressivas e muito “sangue nos olhos”. Isso foi planejado?
Começamos entendendo que havia uma oportunidade de ocupar os quartos vazios em milhares de hotéis no Brasil e no mundo. Só que o formato foi mudando. Achávamos que éramos uma empresa de compra coletiva, mas na verdade aquele era o formato inicial. Era preciso nos reinventar para nos tornarmos uma agência de viagens. A partir disso [dessa consciência], a abordagem diante do público e dos hotéis passou a ser mais efetiva. Hoje temos uma visão clara de ser um marketplace para turismo, conectando hotéis, pousadas, meios de hospedagens, mas também com pacotes e passagens aéreas para nossos clientes.
Onde você busca aprendizado para seu negócio?
Boa pergunta! Primeiro você precisa ter humildade, entender que não tem todas as respostas e que, de fato, precisa que pessoas sejam melhores que você, em todos os meios e durante toda a jornada. É preciso estar aberto a ler e ouvir. O aprendizado que o time do Hotel Urbano busca diariamente não está só dentro da empresa. Também sentamos com os hoteleiros, com as companhias aéreas; olhamos para concorrentes, fornecedores, clientes. No fim, é mais um estado de espírito de estar sempre insatisfeito consigo mesmo, querendo algo a mais – mas entendendo que, baixando a guarda, “abrindo o quimono”, vamos aprender muito mais do que sendo reativos.
Quem te inspira?
Por ser brasileiro, uma pessoa que me inspira mesmo não sendo do mundo dos negócios é o Ayrton Senna, pela postura de ter estado sempre na ponta e, ao mesmo tempo, sempre disposto a melhorar como ser humano e a dividir o mérito com sua equipe, engenheiros, mecânicos.
Cite três livros que te marcaram.
Tem três que eu acho que se conectam entre si: O Banqueiro dos Pobres (Muhammad Yunus), que eu li há tempo, a biografia do Nelson Mandela e A Hora da Verdade (Jan Carlzon), que fala da transformação de um gestor em líder. Em comum, todos tocam na importância do empoderamento humano, no quanto as pessoas precisam se sentir úteis, e do quanto nós, líderes, somos responsáveis por dar confiança a elas, em todos os níveis profissionais de gestão.
“Transformar limão em limonada”: quando isso te aconteceu?
Nesses oito anos de Hotel Urbano, passamos por um crescimento acelerado; depois, acabamos perdendo o controle da companhia, passamos quase um ano longe do dia a dia do negócio. Isso fez falta, porque gostamos muito daquela adrenalina. Para mim e para os outros sócios, decidir voltar ao negócio foi um ponto importante. Tivemos que abrir mão de grande parte do capital que acumulamos para tornar possível essa volta. Não tínhamos todas as respostas, mas estávamos confiantes de que a empresa precisava de paixão para voltar a funcionar.
O que ficou de lição desse momento?
Cada vez mais, as pessoas olham para números, informações. O mundo virou um grande celeiro de dados. Mas as pessoas estão deixando a intuição de lado. Quando saímos do dia a dia operacional, percebemos que nosso DNA foi deixado de lado ao longo da construção da empresa. O que mais aprendemos foi que o empreendedor precisa ouvir sua intuição. Se ficar só olhando para dados, sem tirar nada do papel, ele não sai de casa para trabalhar. Tem que ter o elemento da paixão.
O que significa, para você, ser empreendedor? no Brasil?
Você tem que ser você mesmo e ter um time de pessoas apaixonadas. Nosso país não favorece o empreendedorismo. Se você não reunir pessoas com paixão e vontade de realizar, com o mesmo brilho nos olhos, fica muito difícil.
Como é sua dinâmica com o João [Mendes, irmão e sócio de Duda]? Quem é o good guy e quem é o bad guy nessa história?
Nossa dinâmica é complementar. Ele é um cara tão otimista e realizador quanto eu, mas tem um foco um pouco maior em tecnologia, desenvolvimento e dados, nessa parte analítica; eu olho mais para a formação da cultura, para o time comercial, de novos negócios. O João dá muita atenção ao detalhe, ao dia a dia da operação. Eu, às vezes, saio um pouco, olho mais para o mercado lá fora. Mas, na média, a gente se complementa bem – e está dando certo! [risos]
É cada vez mais comum que empresas abram espaço à cocriação, em busca de soluções inesperadas. Por outro lado, dentro da companhia, é preciso ter hierarquia e alguém que tome as decisões estratégicas. Como você exerce seu poder dentro do Hotel Urbano?
O Hotel Urbano é uma empresa open space, sem muros nem paredes. Eu não tenho sala, nem o João. Tentamos criar uma cultura horizontal, com pouca hierarquia. Claro, sabemos que ela existe e que é importante haver tomadores de decisões. Mas tentamos desenvolver um ambiente onde as pessoas ousem mais e, dentro de um limite, possam empreender dentro da própria companhia.
Gostamos de empreendedor, de dono! De gente que veste a camisa e que, se a luz estiver acesa, apaga porque está consumindo energia. E é importante que as pessoas pensem como donas, para que se sintam à vontade para tomar decisões sem ter que pedir permissão. Muita burocracia engessa a operacionalização.
Vocês se destacaram como um negócio criativo, agressivo e de sucesso. O que o Brasil perderia se sua empresa não existisse?
Hoje, o Brasil tem uma grande operadora de viagens que faz a venda via lojas físicas, com presença em shoppings, mas todas as outras empresas que oferecem a experiência online de se comprar uma viagem são estrangeiras: duas americanas e uma argentina. Ter um player brasileiro que possa crescer exponencialmente – não só aqui, mas mundo afora – é muito bom para o nosso cenário de startups. Temos o foco de nos tornarmos esse player global.
Você já pensou em sair do Brasil, empreender e viver lá fora?
Nunca pensamos em empreender exclusivamente fora do Brasil. Temos uma paixão pelo Brasil e pelas pessoas – tanto pelo potencial turístico quanto pelo potencial de desenvolvimento de uma empresa brasileira que possa expandir para o mundo. Obviamente, em algum momento, podemos ter ficado inseguros com o cenário macroeconômico e político, mas não a ponto de desistir deste país que tanto amamos.
Onde você quer estar daqui a dez anos?
Um dos maiores sonhos é ver nosso trabalho multiplicado no mundo. Quando vemos que mudamos a vida de milhares de hoteleiros e transformamos a vida de milhares, talvez até milhões de pessoas que puderam viajar graças ao nosso trabalho, isso faz brilhar nossos olhos. Queremos multiplicar esse trabalho para várias outras culturas.
Esta é uma das entrevistas que fazem parte da campanha da Oficina. Conheça a marca e leia o bate-papo com os outros empreendedores!