Em setembro de 2014, há pouco mais de um ano, contamos a história do As Boas Novas, um portal que se dedica a fazer curadoria de boas práticas que estão mudando o jeito de nos relacionarmos com o mundo e de fazer negócios de forma inovadora e sustentável. O portal comemorava seus cinco anos de existência e evoluía para um novo modelo de negócio, mais abrangente e focado em consultoria. Para além do conteúdo inspirador e da produção de brand content, um novo serviço estava sendo desenhado: o Simpli.city, que oferece ferramentas para marcas, empresas e governos dispostos a cocriar soluções para as cidades ao lado de seus moradores e outras organizações.
Hoje, Simpli.city e As Boas Novas fazem parte do guarda-chuva de uma nova empresa, a Maker Brands, que tem como pilares a inovação, a sustentabilidade e o empreendedorismo. Em poucas palavras, o propósito da Maker é combinar a agilidade das startups com a escala das grandes organizações para gerar impacto positivo na sociedade. “O mindset de uma startup é voltado à resolução de problemas reais. É exatamente nisso que apostamos como negócio. Nosso papel é identificar qual é o cenário atual, quais são as questões mais urgentes do nosso tempo e como as organizações podem contribuir para desenhar soluções de forma ágil e profunda”, diz Carol Romano, 33, sócia-fundadora da Maker.
Apesar do As Boas Novas não representar lucro na atual estrutura do negócio, alguns clientes, como o banco Santander, para o qual produzem conteúdo de sustentabilidade há mais de cinco anos, chegaram até eles através dele. Hoje, o portal também serve de subsídio para os demais serviços oferecidos pela Maker e, principalmente, funciona como uma fonte de inspiração para Carol e Igor Botelho, 33, seu sócio e marido. Ele fala a respeito:
“É quase uma função política e social publicarmos notícias positivas no As Boas Novas. Isso nos abastece muito. É um canal de pesquisa e de interação com a sociedade e nos ajudou a ter uma visão de mundo melhor, além de nos dar a base para o modelo de negócio que temos hoje”
Focar no que é positivo e inspirar soluções a partir de exemplos práticos são diretrizes do jeito de fazer negócio da dupla. Carol faz um mestrado em Psicologia Positiva, uma ciência comportamental que estuda a felicidade. Resumidamente, a Psicologia Positiva diz que devemos olhar para os nossos talentos e habilidades, descobrir as nossas vocações para, então, provocar transformações em nós mesmos, em nossas relações e no mundo. O projeto de As Boas Novas foi pautado por este pensamento, que também permeia os demais serviços da empresa, como o Business Spark, mais voltado pra inovação nos negócios e o Comunicathon, direcionado a soluções de comunicação. “Queremos fazer um convite a fazer diferente fazendo a diferença”, diz Carol.
MENOS STORYTELLING, MAIS STORYDOING
Igor e Carol começaram a perceber que a maioria das empresas que os abordavam para encomendar um projeto de conteúdo, um planejamento de comunicação (conteúdo era a vocação inicial do As Boas Novas), não estavam prontas de fato para comunicar, por isso, era preciso ir mais fundo. Um exemplo disso é a BR Petrobras, que chegou até eles com o seguinte briefing: temos muitas ações de sustentabilidade que estão pulverizadas dentro da organização e precisamos encontrar um jeito de comunicá-las de maneira coesa.
O projeto inicial intitulado Comunicando as Ações de Sustentabilidade, que inicialmente duraria seis meses, acabou se tornando algo maior e se estendeu por mais de um ano. O processo resultou em um plano de ação que foi entregue ao cliente em um documento conciso que assinala as ações mês a mês e o como cumprir as metas. “Fizemos um diagnóstico no qual pontuamos questões estratégicas a serem desenvolvidas junto a um núcleo ou uma governança de sustentabilidade que precisava ser implementada. Com o entendimento deles, partimos para algo abrangente, que resultou em um plano de ação faseado, baseado na definição de três pilares: estratégia, gestão do conhecimento interno e comunicação”, conta Carol. A comunicação efetiva das ações começou a ser feita no início deste ano.
Mão na massa é a palavra de ordem para eles, por isso a Maker aposta em diagnósticos rápidos, pois, como diz Carol:
“Gasta-se muito recurso e tempo na etapa de diagnóstico, e isso faz com as empresas implementem pouco”
Igor complementa ao dizer que eles propõem “um processo mais profundo do que um workshop de uma semana, mas também não atuamos com a perspectiva de longo prazo, como é mais comum entre as consultorias tradicionais”.
Os dois também acreditam em um processo de planejamento que envolva e engaje o maior número de áreas possíveis, todos os stakeholders, incluindo os consumidores. Na visão da Maker não há clientes, mas sim cocriadores. “Muitas vezes, as empresas nos contratam para ter mais trabalho e não menos”, diz Igor.
EMPODERAR, EMPREENDER E INOVAR
“As empresas precisam lucrar, mas também querem ter relevância. Para isso, é preciso que elas entendam qual é seu real propósito e como se colocar diante das questões mais urgentes do nosso tempo. Para resumir, queremos imbuir as organizações de propósito e urgência”, afirma Carol.
Ela prossegue dizendo que parte desse entendimento passa pelo empoderamento das pessoas que estão dentro das corporações. Igor e Carol acreditam que é preciso enxergar propósito no que se faz, dar autonomia para que as pessoas possam encabeçar seus próprios projetos, e assim elas serão capazes de empreender e inovar, o tal intraempreendedorismo. “Se as pessoas se sentem donas, elas passam a funcionar como uma célula que transforma a organização de dentro para fora”, diz ela.
O termo empreendedor tornou-se algo um tanto místico hoje em dia, mas para Igor todos nós somos makers, de alguma forma: “Se você teve um filho, empreendeu. Se escreveu um livro, empreendeu. O empreendedor é aquele que resolve um problema de forma rápida e ágil, e assim, quebra paradigmas, inova. Perdemos a crença nas instituições, então o que sobra somos nós mesmos. O que você pode fazer agora? O que nós podemos fazer agora?”.
A trajetória da dupla é permeada pelo espírito maker. Igor foi um dos fundadores da Mandalah, uma consultoria de inovação consciente, e Carol começou sua jornada empreendedora com As Boas Novas, ao lado de outros sócios. Ambos estão super conectados ao universo das startups, com as quais trabalham diretamente, além de participarem de eventos de inovação e tecnologia pelo mundo, como o SxSW (South by Southwest), em Austin, nos Estados Unidos. E é com esse mindset de startup que a Maker entra nas empresas e ajuda a promover transformações no jeito de pensar o negócio.
Foi assim com a Nestlé, hoje a maior empresa de alimentos do mundo, e com a qual estão há mais de dois anos. A Maker foi chamada para uma missão: desenvolver e implementar o departamento de inovação no Brasil nas frentes de Negócio e Cultura. Este processo incluiu a modelagem de novos negócios, a implementação de uma cultura de inovação por meio de viagens, palestras, encontros e workshops, como o Sprint, uma maratona de inovação criativa com duração de uma semana. Tudo isso com a atuação e a presença de diferentes unidades de negócios da empresa.
Entrar dentro de uma organização global, mexer em suas entranhas e jeito de pensar não é tarefa fácil, mas Carol garante que a partir do momento que elas entendem que é preciso inovar para continuar de portas abertas e manter a sua relevância, e que não é possível fazer isso sem ser sustentável, as mudanças acontecem. Foram levantados temas estratégicos para a corporação. E, para ir mais fundo nas discussões, nada melhor do que ter contato com o mundo real, ou “get out of the fucking building”. A jornada que a Maker propõe é também baseada no aprendizado experimental, ou seja, é preciso sair do escritório e ir para as ruas, conversar com as pessoas.
“Levamos os funcionários da Nestlé para uma experiência em campo. Em seguida, eles foram divididos em grupos e tiveram missões, como conversar com os consumidores nas ruas, visitar pontos de vendas. Tudo isso para terem uma percepção real do tema em questão”, conta Igor. Não é raro um assunto levantado pela Maker Brand se desdobrar em movimentações internas e questionamentos dentro da própria organização. “Esse tipo de iniciativa, que nasce de uma discussão e inteligência coletivas, é muito útil para criar subsídios para uma mudança de portfólio, por exemplo”, conta Carol.
Outro resultado interessante deste processo é o intercâmbio entre executivos da empresa e donos de startups, indicados pela Makers. A aproximação começa com bate-papos e troca de experiências e pode ter desdobramentos bem maiores. “Queremos convergir esses dois mindsets. De um lado, temos a agilidade de uma startup, de outro temos a estrutura e a larga escala de uma corporação. O que queremos é usar o que cada uma delas tem de positivo para promover transformações e encontrar soluções”, diz Igor.
E O FUTURO, O QUE DIRÁ?
“Espero que a Maker não exista num futuro breve”, dispara Igor. Explicando melhor, isso quer dizer que ele vislumbra uma sociedade em que empresas, marcas e governos já tenham conseguido chegar às respostas para os problemas mais urgentes:
“O próximo estágio da sustentabilidade é gerar impacto positivo e não apenas mitigar os impactos negativos. Hoje ainda temos ainda poucas empresas que realmente estão neste caminho”
Uma visão otimista demais? Não para eles. Carol acredita que “se identificarmos o real job to be done de cada corporação, no atual contexto, é possível gerar impacto positivo, sim. E a maneira mais eficiente e disruptiva de conseguir isso é usar as metodologias de empreendedorismo de uma startup”. E, se as mudanças não acontecem tão rapidamente, o importante é manter a resiliência. Em uma viagem recente para a Nova Zelândia, onde passou dois meses para estudar inovação social, Igor esteve ao lado de lideranças de várias tribos, do Greenpeace aos Maori.
Ali, renovou suas energias e sua vontade de fazer a diferença pra um mundo melhor. “Acredito que estando dentro das corporações, conseguimos ajudá-las a pensar diferente e a mudar alguma coisa. A cada bote salva-vidas que a gente tira de dentro do Titanic e que opera em uma lógica diferente, da cadeia de produção à distribuição, gerando valor pra sociedade e impacto para os negócios, conseguimos mostrar que é possível”. Essa analogia aplicada aos negócios foi curiosamente passada a Igor por uma líder de uma tribo Maori.
Outra forma de fortalecer a atuação da Maker é trabalhar diretamente com startups e ampliar o número de empresas desse tipo em seu portfólio. Para o futuro, a meta é triplicar o número de startups atendidas. “Estamos criando as empresas do sistema novo enquanto tentamos mudar o mindset das antigas”, diz Igor. Entre os planos estão ainda a implementação de três Corporate Ventures no Brasil e a almejada expansão internacional. Enfim, boas novas.