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Draft ano 2 – A ClapMe perdeu o investidor, a sede e precisou reinventar seu negócio para não falir…

Italo Rufino - 20 set 2016 Filipe, CEO da ClapMe, dez quilos mais magro depois de reorganizar a vida pessoal e salvar sua startup da falência.
Filipe, CEO da ClapMe, dez quilos mais magro depois de reorganizar a vida pessoal e salvar sua startup da falência.
Italo Rufino - 20 set 2016
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Em seu quarto mês de existência, em dezembro de 2014, o Draft retratou uma promissora startup paulistana. Com a missão de ser o “maior palco do mundo”, a ClapMe mantinha uma plataforma de transmissão online de shows que, na época, possuía 100 mil usuários, dos quais 10 mil eram artistas e bandas. Naquele ano, a startup faturou cerca de 500 mil reais. Quase dois anos após a primeira aparição, Filipe Callil, 27 anos, fundador da ClapMe, aceitou o convite para contar quais foram os desafios e conquistas do negócio desde então.

Uma das principais mudanças foi percebida logo ao agendar a entrevista. A ClapMe está de casa nova, um escritório num prédio comercial novinho em folha na avenida Berrini (um dos centros financeiros da capital paulista). No dia da conversa antes da sabatina, Filipe leu rapidamente o texto publicado no passado. Rapidamente mesmo. Numa leitura dinâmica em voz alta, ele parecia ansioso para contar todas as novidades – e foram muitas.

Há quase dois anos, a ClapMe saiu no Draft (clique na imagem para ler a reportagem).

Há quase dois anos, a ClapMe saiu no Draft (clique na imagem para ler a reportagem).

Primeiramente, a ClapMe como conhecíamos não existe mais. O modelo de negócio baseado em livefunding, em que produtores de conteúdo usavam a plataforma para realizar transmissões ao vivo, ao mesmo tempo em que recebiam doações de fãs, se mostrou insustentável financeiramente.

As vendas não cresciam proporcionalmente à base de fãs e ao alcance dos artistas – e os músicos, principalmente os de grandes gravadoras, não se sentiam tão confortáveis em pedir doações. As oscilações nas receitas, provenientes de uma comissão do valor arrecadado pelo artista, fizeram com que a ClapMe não decolasse como negócio.

Para piorar a situação, a ClapMe perdeu seu principal investidor — Ricardo Marques, responsável por manter a operação brasileira da Vevo, plataforma de clipes musicais. Em abril de 2015, a Vevo determinou que o investidor não poderia mais participar de negócios que pudessem ter conflito de interesses com a marca americana. Numa tacada só, a ClapMe também perdeu sua sede, que ficava dentro da Vevo, onde usufruía de departamentos compartilhados como RH, Jurídico e Financeiro. Filipe comenta a situação difícil.

“Foi como um divórcio. Talvez, a maior lição tenha sido: tenha bons aliados, mas jamais torne-se dependente deles”

O trauma obrigou o time da ClapMe, que além de Filipe (CEO) é composto por Felipe Imperio (CMO), 35, Diego Yamaguti (CFO), 34, Gabriel Massote (CTO), 29, e Celso Forster (CCO), 34, a rever todos os princípios e premissas da empresa. Até o nome da startup foi posto à prova. Mas sobreviveu.

MUDAR PARA NÃO MORRER

Nesses tempos difíceis, a casa de Filipe tornou-se o QG da ClapMe. As discussões para escapar da derrocada lá prosseguiam. Logo os sócios chegaram à conclusão de que a startup não poderia continuar focada em tecnologia e operar no modelo de software como serviço (SaaS).

Acima, os fundadores da ClapMe: , , Filipe e . Eles recorreram a aceleradoras para se reinventar e sobreviver.

Acima, os fundadores da ClapMe: Diego Yamaguti, Celso Forster, Filipe Callil e Felipe Imperio. Eles recorreram a aceleradoras para se reinventar e sobreviver.

Já havia várias ferramentas que permitiam a transmissão de vídeos ao vivo, que, embora não fossem concorrentes, poderiam ser substitutas, como o Youtube Live, o Facebook Live e o próprio Snapchat. Além disso, sua então maior rival, a Netshow.me, já estava se dedicando a tecnologias para transmissões (hoje, a ClapMe usa os serviços de sua antiga concorrente e os sócios são amigos de longa data).

Por outro lado, a aposta em conteúdo por streaming se mostrou ainda mais promissora do que no passado. A qualidade da internet e o tráfego de vídeos melhorou muito desde 2011. De acordo com uma pesquisa da Cisco, 80% do tráfego mundial de internet será de vídeos em 2019.

A produção de conteúdo próprio para os canais de streaming – um potencial da ClapMe – também estava cada vez mais em voga. O maior exemplo é a Netflix, que deu saltos de crescimento após investir em séries originais e chegou a mais de 81 milhões de assinantes no mundo, em abril de 2016. Num comunicado da empresa, o CEO Reed Hastings disse que o sucesso está diretamente ligado ao crescimento de produção própria. Filipe fala desse aspecto na ClapMe: “Nosso maior ativo era e ainda é a entrega de conteúdo. A gente adquiriu experiência em gravar espetáculos — de música, humor ou teatro — e decidimos focar na produção de conteúdo que merece aplausos e surpreende o fã, que hoje paga por exclusividade, curadoria e experiências”.

O PAPEL DAS ACELERADORAS NA SOBREVIVÊNCIA DO NEGÓCIO

Sem dinheiro para investir na empresa, os sócios se inscrevem em quase uma dezena de aceleradoras. A primeira a aceitar a ClapMe foi a Jump Brasil, instalada dentro do Porto Digital, no Recife. Entre agosto e setembro de 2015, os sócios se revezaram em idas e vindas à capital de Pernambuco, onde usufruíram de escritório e recebiam mentoria e coaching. Filipe, que não conhecia muito o Nordeste, conta:

“Foi uma baita escola. O Porto Digital tem uma efervescência cultural muito forte e é organizado para aglutinar pessoas e empresas para se ajudarem. Nos encantamos”

Foi na Jump Brasil que os sócios validaram o novo modelo de negócio. No entanto, ainda não tinham equipe e equipamentos e a plataforma estava desatualizada. O dinheiro da aceleradora também era escasso – os 40 mil reais foram usados para pagar antigas dívidas, os primeiros salários de funcionários de tecnologia, o aluguel de um pequeno apartamento que os sócios dividiam e custear as viagens a São Paulo. Era necessário mais investimento.

Na nova interface da ClapMe, uma "Netflix dos shows ao vivo" em vez do antigo formato de pagar pelo streaming ao vivo.

Na nova interface da ClapMe, uma “Netflix dos shows ao vivo” em vez do antigo formato de pagar pelo streaming ao vivo.

Em outubro de 2015, Filipe retomou contato a Triple Seven, uma aceleradora de São Paulo fundada no ano anterior com capital de 4 milhões de reais para aportes em startups, e que opera com investidores participando ativamente da gestão das investidas.

Os gestores da aceleradora afirmaram que a ClapMe tinha tudo para ser “a Netflix dos shows”. Logo, ofereceram capital e escritório compartilhado com outras startups. A equipe de tecnologia ficou em Recife e a de produção e os sócios em São Paulo.

Desde janeiro deste ano está no ar a nova plataforma da ClapMe. Agora, o usuário paga uma assinatura de 15,90 reais por mês para ter acesso a todo o conteúdo. Também é possível comprar shows avulsos, que custam entre 2 e 20 reais.

Em média, a ClapMe faz 35 transmissões por mês, todas filmadas em São Paulo. Já teve show de grandes nomes do sertanejo, como João Bosco & Vinicius e Fernando & Sorocaba; de artistas da nova MPB, como Filipe Catto, Liniker e Aline Muniz; e de pop rock, como Cachorro Grande e Vivendo do Ócio.

NA NOVA FASE, SHOWS EM HD

Na parte de humor, o grupo Hermes & Renato e a dupla Mauricio & Louise mantêm um programa fixo na plataforma. Também já houve apresentações de Rafael Cortes, Murilo Couto e outros conhecidos do stand up.

A gravação dos espetáculos é feita por uma equipe própria, que diariamente percorre casas de shows com tripé, câmeras e cabos para realizar as transmissões – o conteúdo gravado meio que de improviso dos anos iniciais da startup deu espaço a transmissões em alta definição. Assim, hoje a ClapMe tem parceria com 12 casas de shows (como Wood’s SP, Centro Cultural Rio Verde e Centro Cultural São Paulo). Há também associações com produtoras de eventos e festivais, como Music Video Festival e Sofar Sounds.

A startup também possui um núcleo de branded content e tem parceria com o Terra e a BR Media Group, agência que vende mídia em redes sociais de influenciadores digitais, como atores, humoristas e blogueiros. Recentemente, a ClapMe participou de uma ação do chocolate Lacta 5Star, marca da Mondelez, que contou com apresentação de humoristas dentro da plataforma ClapMe. Filipe, escaldado, ressalta que as parcerias são extremamente importantes:

“Não dá para depender unicamente de aliados, mas só cresce e sobrevive quem estiver junto a eles”

Atualmente, a nova ClapMe possui 500 assinantes e, somente em julho, vendeu mais de 1 500 ingressos avulsos para seus shows. Até o fim do ano, a startup espera faturar 1,5 milhão de reais. Cerca de 70% das receitas devem vir da área de branded content, e o break-even da operação é esperado para março de 2017.

As receitas ajudarão a ClapMe a buscar planos ousados. Nos próximos cinco anos, Filipe pretende implementar uma pequena equipe em 16 cidades-chave, em cinco continentes – as primeiras devem ser Londres, Berlim e Los Angeles, onde já aconteceu transmissões teste.

NEGÓCIO SAUDÁVEL, VIDA SAUDÁVEL

Nas palavras de Filipe, quando se empreende, há um desejo intrínseco de impactar o mundo. E para ser um agente da mudança é necessário, primeiro, mudar seus próprios hábitos. Visando uma vida mais saudável, ele fez uma reeducação alimentar e emagreceu 10 quilos ao reduzir de sua dieta carboidratos, glúten e leite e derivados. Também voltou a praticar jiu-jitsu, esporte que deixou de lado ainda na adolescência. Além disso, adotou a bicicleta como meio de locomoção no dia a dia – faz 12 quilômetros diários no trajeto casa-trabalho.

Filipe com sua agora noiva, Lívia, pedida em casamento em Monte Verde.

Filipe com sua agora noiva, Maria Lívia, pedida em casamento em Monte Verde (MG).

Em casa, mais mudanças. Desde setembro de 2015, ele está morando com sua noiva, a jornalista Maria Lívia, de 27 anos, paixão desde o tempo da faculdade, onde se conheceram. “Ela segura boa parte das contas de casa e é uma das pessoas que mais me motiva a superar os desafios da ClapMe, que não são poucos”, diz.

No dia da entrevista, feita no início de agosto, Filipe estava editando o vídeo que usaria para pedir a mão da amada em casamento. O pedido aconteceu semanas depois durante um passeio a Monte Verde, Minas Gerais, local da primeira viagem do casal após o início do namoro. Para a alegria dele, Lívia disse sim.

“Quando há equilíbrio na vida pessoal e profissional, uma coisa sempre favorece a outra”

Nos últimos meses, Filipe voltou a atuar como jornalista e passou a escrever para o Draft. No site, ele já contou mais de 10 histórias de startups e retratou sua própria experiência no curso de liderança criativa da THNK. Em suas palavras, essa foi uma das experiências mais intensas e produtivas que vivenciou recentemente, e o ajudou a melhorar o relacionamento com seus pares e funcionários – que somam, hoje, 15 pessoas. Convicto de ser um empreendedor e jornalista por essência, Filipe segue o jogo. Quer dizer, o show.

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