O mundo de hoje — sabemos — muda rápido, exige agilidade de quem empreende, em pequena ou larga escala. Alguns dos modelos tradicionais de trabalho — também sabemos — entraram em extinção. Uma das consequências deste cenário é que as grandes corporações começaram a perder seus profissionais mais talentosos e inovadores, já não tão interessados assim neste universo. O caminho não é mais um só, e trabalhar em algo mais pulsante, desafiador e cheio de propósito, como uma startup, parece muito mais atraente. Outra é que começaram a surgir mais startups do que vagas de emprego. Mas parte delas (25%, segundo um estudo da Fundação Dom Cabral) fecha as portas antes de completar um ano de vida. E os talentosos e inovadores profissionais descobrem que empreender é mais difícil do que aturar o ex-chefe da corporação.
As duas situações acima nos levam a um questionamento: Quem precisa mais do outro, as corporações das startups ou as startups das corporações? Difícil cravar. Mas é certo que ambas se beneficiam das características da outra. E o importante é que startups e corporações estão aprendendo como trabalhar juntas. Uma das tendências mais bacanas dessa experiência é o Corporate Venture (CV), que tem se tornado uma tendência no mercado de capital de risco: trata-se de fundos de investimentos criados por grandes corporações para financiar o desenvolvimento de startups e pesquisas, com benefícios diretos a estas e aquelas.
Os benefícios do CV podem ser diversos, com impactos positivos em diferentes vertentes — para startups e corporações. No aspecto comercial, para a startup significa alcançar clientes e amarrar parcerias que dificilmente seriam possíveis a curto prazo sem um apadrinhamento corporativo. Para a corporação, representa a chance de aumentar sua entrega de serviços, produtos e benefícios com investimentos relativamente baixos.
No aspecto de cultura empresarial, para a startup a experiência é uma oportunidade de aprender com quem já passou dos 1 000 funcionários como fazer a gestão de um pelotão desses. Por sua vez, para a corporação, é a oportunidade de desenvolver um diálogo e práticas sociais com base nos novos modelos de empreendedorismo e economia criativa.
Outro ponto relevante — e potencialmente transformador — diz respeito a processos. No CV, a startup pode aprender que o sucesso depende de uma boa engrenagem e que, nem sempre, vale a pena reinventar o que já funciona. A corporação, de seu lado, pode vir a descobrir que alguns de seus processos estão ultrapassados podem, ou até devem, ser repensados.
UM MODELO COM ATRATIVOS E ESPAÇO PARA CRESCER
O Corporate Venture apresenta-se como algo potencialmente benéfico também para o mercado que, em resumo, ganha mais vagas de empregos. E o formato pode ser um atrativo também para multinacionais que nunca se interessaram em investir e operar no nosso país.
“O Corporate Venture pode ser uma oportunidade de fomentar a inovação no país, atrair capital para essas empresas que estão desenvolvendo soluções com potencial de aproveitamento para a indústria e mostrar, às grandes multinacionais, o que está sendo feito por aqui”, afirma David Barioni Neto, Presidente da Apex-Brasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos).
Por ser um modelo de negócio ainda muito incipiente, o CV tem funcionado como uma espécie de laboratório experimental, ainda sem muitas regras ou padrões. Cada corporação tem inventado o seu próprio meio e processo para se inserir, de alguma forma, no modelo. Em comum, a vontade de investir e se beneficiar da proximidade de startups.
Justamente por ser uma área nova, tem de tudo: concursos e programas de empreendedorismo, incubadoras, aceleradoras e até investimentos e aquisições num formato bem mais “low-profile” (traduzindo, feitas na surdina mesmo).
Com tantas variáveis, já se criaram até duas divisões de conceito: o CV externo (quando o foco da companhia está nas empresas criadas por empreendedores aleatórios) e o CV interno (quando a própria companhia desenvolve um braço no qual serão criadas novas empresas).
Dentre as companhias que se destacam como pioneiras desse mercado é possível citar Braskem, Cemig, Dow, IBM, Intel, Telefônica, Google, Promon, Votorantim, Odebrecht, 3M e, RBS, Grupo Bandeirantes, Itaú, Bradesco, Natura, Pernould-Ricard, entre outras. Abaixo, listamos alguns exemplos dos trabalhos que elas têm realizado:
O que é?
Programa de aceleração do Banco Bradesco focado em startups com soluções aplicáveis ou adaptáveis ao setor financeiro. Empresas que atuam em outros mercados com uma certa tração também podem se inscrever no edital.
Prós?
As startups são estruturadas para alcançarem grandes mercados e demandas reais. E, quem sabe, se tornarem parceiras estratégicas do Bradesco. Além disso, o banco não retém um percentual de ações (equity) das empresas escolhidas. Apenas passa a exercer uma preferência de compra.
Contras?
Entre centenas de startups inscritas, apenas 10 são escolhidas por ciclo. E o processo de seleção não é dos mais, digamos, inovadores (lembra um edital público). Se de um lado o banco não retém percentuais, do outro, também não investe capital nas startups – pelo menos, não diretamente como funding.
Quem está lá?
Oito startups participaram do primeiro ciclo. São elas: Screemcorp (de gestão de conteúdo interativo em TVs corporativas), NUE (de solução de vitrine interativa), QueroQuitar (auto atendimento online para renegociação de dívidas), Qranio (plataforma móvel para treinamento), Atar (dispositivo vestível para pagamento digital), Rede Frete Fácil (de gestão de oferta e demanda de fretes rodoviários), Sensedia (de solução de gerenciamento de APIs) e ShopMobi (solução para gestão de atendimento em agências).
Como participar?
No momento, o programa está em processo de avaliação das startups que se inscreveram para o segundo ciclo de aceleração. As inscrições para o terceiro ciclo devem começar no segundo semestre.
O que é?
Desenvolvido pela Braskem, o programa busca empreendedores com projetos que tragam melhorias ao meio ambiente com o uso do plástico.
Prós?
Até 20 startups são selecionadas por ciclo. Durante o programa, elas podem se aproximar de clientes, parceiros e investidores da multinacional. Existe também a possibilidade criar uma relação de negócios duradoura com a Braskem.
Contras?
A princípio, as startups selecionadas recebem apenas 45 dias de mentorias e suporte. O programa também não oferece um investimento financeiro direto.
Quem está lá?
19 startups foram escolhidas para o primeiro – e, por enquanto, único – ciclo. Entre elas, a Beenoculus (que produz óculos de realidade virtual para smartphones), a Cultive (um sistema automático para monitorar e irrigar plantações) e a CasaClic (plataforma que constrói moradias populares com paredes de PVC).
Como participar?
As inscrições são feitas no próprio site do projeto. Porém, as chamadas para o segundo ciclo ainda não foram abertas.
O que é?
Fundo de investimento e aceleração da Coca-Cola focado em startups com soluções disruptivas espalhadas ao redor do mundo e com atuações nos mais diversos mercados.
Prós?
A Coca-Cola chega a investir até um milhão de dólares em projetos que ainda nem saíram do papel. Além disso, a companhia oferece todo o suporte estratégico e comercial para o negócio engrenar. Mas, o melhor de tudo: a startup nasce com um cliente fiel chamado Coca-Cola.
Contras?
São pouquíssimas vagas ao redor do mundo e não existe um programa bem formulado com chamadas, etapas etc. Alguns projetos, inclusive, nascem dentro da própria Coca-Cola com funcionários da companhia.
Quem está lá?
Até o momento, oito startups espalhadas ao redor do mundo, com atuações diversas. A Winnin, plataforma de vídeos fundada no Rio de Janeiro e que foi mostrada aqui no Draft, é uma delas.
Como participar?
Por não ser um programa com formato padronizado, talvez, o melhor caminho seja formatar um projeto e enviar para os responsáveis pelo Coca-Cola Founders.
O que é?
Competição de startups patrocinada pela Chivas para encontrar ideias ao redor do mundo que podem mudar, para melhor, o modo como vivemos.
Prós?
As empresas selecionadas recebem uma quota de um fundo de um milhão de dólares do The Venture e um programa de imersão no Vale do Silício, Califórnia. Além disso, os empreendedores têm acesso a ferramentas e mentorias para acelerar o crescimento.
Contras?
Competição acirrada. Existem várias eliminatórias regionais ao redor do mundo e apenas uma empresa de cada lugar vai para a grande final, na Califórnia.
Quem está lá?
As startups Epitrack e MGov foram as últimas a vencerem a etapa regional do Brasil. A saber: o Draft é um dos parceiros de mídia do projeto.
Como participar?
As inscrições são feitas no próprio site do projeto.
QUEM ESTÁ CHEGANDO
No final do ano passado, a Apex-Brasil promoveu em São Paulo, capital, o Corporate Venture in Brasil 2015. O evento reuniu representantes internacionais de algumas das maiores companhias globais – entre elas, IBM, Philips, Samsung, Microsoft e Monsanto – para discutir o ecossistema de empreendedorismo brasileiro.
Segundo John Hamer, diretor de Investimentos da Monsanto Growth Ventures, “o Corporate Venture é, na realidade, mais do que investir em pequenas empresas, é descobrir novas oportunidades de negócios”. A Monsanto atua há alguns anos com o modelo e já possui cerca de 400 empresas em seu portfólio de venture capital.
Durante o encontro, o diretor de Investimentos da Samsung Ventures, Luis Arbulu, explicou o perfil das startups que interessam para a empresa. “A Samsung se interessa por soluções que possam ser desenvolvidas para atender o mercado global. Se encontrarmos no Brasil alguém que esteja desenvolvendo algo que possa ser interessante para nós, com certeza temos interesse em investir”, conta. A Samsung Ventures já tem projetos em países como Egito, Israel e Estados Unidos.
Ainda há muito a ser escrito sobre como corporações e startups podem colaborar, crescer e inovar juntas. Ao longo do caminho, é natural que aconteçam erros, ajustes, ou até mesmo conflitos. A nossa aposta é que não só a necessidade, mas curiosidade pelo outro e a vontade de inovar são os alicerces para algo valioso a ser construído.
O mercado financeiro passa por transformações tectônicas, com o lançamento do Pix e a regulamentação do Open Banking. Entenda como o BV, ex-Banco Votorantim, vem se reposicionando para atuar como uma plataforma junto a startups e expandir em meio à disrupção do setor.
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