Quando os sócios da Trigg decidiram que a startup, lançada oficialmente em maio deste ano, ofereceria o serviço de cartão de crédito em uma plataforma digital, quebraram a cabeça em busca de um benefício que pudesse diferenciá-la do que já existe no mercado, algo que pudesse “ser útil” de verdade. Eles não queriam oferecer mais um programa de milhagens que acaba deixando aquela dúvida se os 70 mil pontos acumulado valem uma passagem para o Japão ou uma escova de cabelo.
Após uma longa fase de pesquisa por diferentes instituições financeiras no mundo, os sócios Marcela Miranda, 39, especializada em Marketing, Guilherme Müller, 48, engenheiro da computação, e Alexandre Pereira, 47, analista de sistemas, optaram por um sistema ainda pouco conhecido no Brasil: o cashback. Com ele, a cada compra realizada com o cartão, uma porcentagem do valor volta para o cliente. Já era algo “útil”, e então eles acrescentaram mais um diferencial: a possibilidade de direcionar esse dinheiro para uma causa. Assim, junto com a Trigg, nasceu também o programa de empreendedorismo social chamado “Triggers Powered by Visionários” e a Triggers, uma incubadora de negócios sociais.
Os idealizadores da Trigg estão juntos desde 2009, quando formaram a CBYK Grupo, com um objetivo tanto quanto vasto: olhar para o mercado e inovar em cima de algo que já exista utilizando tecnologia. Juntos, já criaram a Beer Box (um e-commerce de cerveja artesanal que chegou a virar bar na Vila Madalena, mas foi vendido), e a Grumft, (uma startup para venda de mídia que está consolidada no mercado).
Nessa busca por “inovar”, Guilherme subiu até os Estados Unidos, em 2015, atrás de alguma novidade e… Conheceu o mundo encantado das fintechs. Inicialmente, a Trigg foi pensada para conceder crédito pessoal online. Para operar nesse mercado, porém, é preciso estar associado a alguma instituição financeira. Guilherme procurou a Omni, que está há 22 anos no mercado e é especializada em financiamento de veículos usados. Seu presidente e fundador, Érico Ferreira, 57, viu a oportunidade de se modernizar e topou investir. Os sócios preferem não revelar o valor do investimento inicial na fintech, mas informam que 70% veio da Omni e 30% da CBYK.
DE REPENTE O PAÍS DESACELERA — E SEU BUSINESS TAMBÉM
Entre dezembro de 2015 e julho de 2016, a Trigg funcionou em beta, para conhecer seu público. Devido à crise financeira enfrentada pelo país e ao fato da área de atuação ser inédita para ambas as empresas – o trio se via como fintech pela primeira vez e a Omni nunca havia feito algo totalmente online —, houve uma desaceleração do negócio e uma pausa para reanálise.
Marcela, Guilherme e Alexandre voltaram mais uma vez as atenções para o mercado e viram o cartão de crédito Nubank desfilando sozinho na passarela digital brasileira. Mais muitas reuniões para redirecionar as estratégias, todos de acordo, inclusive a Omni, e em maio deste anos, finalmente, a Trigg também colocou seu cartão de crédito na praça.
Com bandeira Visa, qualquer pessoa com renda mínima de 1.500 reais pode baixar o app via iOS e Android. Na Trigg há algumas tarifas tradicionais, como 7% para saques no Brasil e 10% no exterior. Caso o cliente precise parcelar a fatura, é cobrada uma taxa de 15,90% ao mês. E há o custo de 9,90 reais pela segunda via do cartão. Mas Marcela, que é Head da startup, afirma que caso haja algum problema, como uma falha no chip, a outra via é gratuita. “A gente cobra quando há uma perda, roubo ou por razões estéticas. Temos a versão cinza e verde e acontece de pedirem para mudar a cor. Aí cobramos”, diz.
Os três primeiros meses de utilização do Trigg são gratuitos, depois é cobrada uma anuidade de 118,80 reais, que pode ser dividida em 12 parcelas mensais. O valor, porém, pode ser zerado e até revertido por conta do cashback. É a grande aposta da startup.
A porcentagem do reembolso do valor gasto varia de 0,5% a 1,3% do total da fatura. Em um simulador no site é possível verificar quanto voltaria a cada compra, antes de realizá-la. Por exemplo, se a pessoa gastar 1.000 por mês, terá um cashback de 0,7%, ou seja, 7 reais de volta. Para empatar com a anuidade e, portanto, não ter custos com o cartão, é necessário ter uma fatura de 1.414,28 reais por mês. Gastos a partir de 5.000 reais mensais conseguem a taxa de retorno máxima, de 1,3%.
UM CARTÃO DE CRÉDITO QUE TEM UM REALITY SHOW
O dinheiro resgatado pode ser utilizado como crédito na própria fatura ou ser doado para a Triggers. E aí entra o benefício para a sociedade. O cartão de crédito é o único no país que possui uma contrapartida direcionada ao empreendedorismo social. Desde abril, a fintech criou uma espécie de concurso de startups, quase que um reality show (com direito a websérie e canal no YouTube), para divulgar este sistema. O tema deste ano é Negócio Social e dez projetos com este viés foram selecionados, de 478 inscritos, para participar do programa.
Em agosto, restarão apenas cinco, que seguirão participando de uma série de desafios, com mentoria de importantes líderes de empresas como YouTube, Twitter, e Johnson & Johnson. O andamento do processo pode ser acompanhado pelo site, por meio da websérie. No “reality show” os times de negócios sociais visitam os locais dos desafios, como o GRAACC, em São Paulo. O vencedor recebe um aporte de 50.000 reais, mais o acumulado em doações dos consumidores do cartão de crédito, além de uma aceleração de quatro meses. Até o início de julho havia pouco mais de 1.500 reais já doados por clientes da Trigg para este fim.
O cashback e o programa de aceleração social são as principais diferenças em relação ao NuBank (seu principal concorrente) que, em compensação, não cobra anuidade, mas cobra para quem quiser participar do programa de pontos.
Marcela conta que, ao estudar programas de milhagens, notou que boa parte dos brasileiros não sabia como utilizar os pontos adquiridos. “Conheci uma mulher que tinha 70 mil pontos acumulados e foi toda animada trocar, mas o máximo que conseguiu foi uma escova de cabelo. Isso quando vão trocar. Muitos gostam de saber que existe o benefício, mas não o utilizam.”
O contraponto dos benefícios da Trigg (o cashback e o Triggers) é a anuidade gratuita. Na startup, porém, o que dá dinheiro é o interchange, ou seja, a taxa que a maquininha do cartão cobra a cada transação realizada. Quando não há maquininha, um terminal de cobrança executa a operação e essa taxa varia de 4% a 7% da venda (o valor é dividido entre a empresa que oferece o meio de pagamento, a Visa e a Trigg).
Por estar operando há pouco mais de três meses, os sócios não quiseram revelar quanto faturaram até aqui e estipularam como meta para o final do ano ter 45 mil clientes ativos. O único número revelado pela Trigg são as despesas destinadas em 2017 para comunicação e marketing: 1,8 milhão de reais.
COMO SER INOVADOR COM UM PARCEIRO “OLD SCHOOL”
A parceria para criação da Trigg uniu duas empresas de gerações diferentes e tem sido importante para haver mudanças e melhorias em ambas. Marcela conta que demorou para conseguir convencer Érico, o presidente da Omni, de que não fazia sentido sediar a Trigg dentro de uma empresa tradicional, com mais de 20 anos de existência.
“A gente não queria estar em um lugar com cara de banco tradicional, com carpete no chão, cortina na janela. Não tinha nada a ver com a gente. Aos poucos, nosso sócio entendeu que a gente vive em um ritmo diferente e tem um modelo de trabalho diferente”, conta.
A Omni cuida da parte de crédito, desenvolveu todo o sistema de avaliação e aprovação de novos clientes. Esse setor é um dos que mais desafia a Trigg, e Marcela diz que desde o início há reuniões semanais para pensar sobre a qual seria a política de crédito, devido às variáveis do mercado. Nos primeiros meses, a fintech sofreu por ter elaborado um modelo bastante restritivo. “Isso foi ruim. Tivemos muita reclamação nas redes sociais. Pensavam que a gente não era sério”, diz. O momento foi delicado:
“Até as pessoas entenderem que o cartão existia de fato e que realmente oferecia benefícios demorou um pouco. Tivemos que afrouxar um pouco as restrições”
A Trigg hoje emprega 150 funcionários. Guilherme cuida dos Negócios e do relacionamento com a Omni. Alexandre está à frente da parte de tecnologia. Marcela é responsável pelo Marketing e pela Comunicação, e gosta de contar que a estrutura de trabalho da startup é horizontal, sem chefes nem gerência, apenas com líderes de projetos.
E conta uma quase anedota: “Outro dia falei para o designer pintar uma parte do chão de verde. Achei que ficaria legal. Ele discordou. Ficamos nesse embate. Ele pegou um monte de outras opções e não teve jeito. Não quis botar o verde e não botou. A área visual é realmente dele e é isso mesmo. A galera está encontrada no que está fazendo. Criou-se uma cultura e quem se sente um peixe fora d’água acaba saindo de maneira espontânea”.
EM BREVE, PULSEIRA EM VEZ DE CARTÃO
Os próximos passos da Trigg já estão planejados. Em agosto, a fintech passará a oferecer crédito pessoal pelo cartão de crédito. Também oferecerá uma pulseira que faz as vezes de cartão. Os funcionários já estão testando o modelo há alguns meses, fazendo os últimos ajustes para poder oferecer a peça. Marcela fala a respeito: “Queremos lançar produtos que tenham apelo com o nosso público. Quero lançar seguros, mas de uma forma legal, que não atrapalhe o nosso core. Como o seguro para bike, por exemplo, seguro de celular. Estamos conversando com algumas empresas de assistência que sejam aderentes à galera que usa cartão digital”.
E há mais novidades a caminho. Marcela conta que Omni adquiriu, há apenas um mês, o Banco Pecúnia, que era controlado pelo francês Société Générale. Isso aumenta exponencialmente as possibilidades da Trigg. “Agora, o céu é o limite. Há um mundo de coisas que podemos fazer. Dá para pensar, por exemplo, em aplicação para cashback. Enfim, vamos aguardar os próximos passos”, diz, de olho no futuro que já chegou.
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